O Estado de S. Paulo, 22 de junho de 2013.
O futuro que passou
Há duas décadas, o Brasil só faz avançar - e no
entanto ninguém aguenta mais
22 de
junho de 2013 | 17h 03
Ivan
Marsiglia - O Estado de S. Paulo
Enfim
concedida a revogação dos aumentos das tarifas de transporte nas duas
principais metrópoles brasileiras, Rio de Janeiro e São Paulo, a tarde de
quinta-feira se anunciava como o momento de comemoração para o movimento cívico
e apartidário que tomou as ruas do País nas últimas duas semanas. O que se viu,
no entanto, foi a expansão incontrolável dos protestos, com mais de 1 milhão de
pessoas em cerca de cem cidades brasileiras. E, embora o tom geral das massas
de manifestantes se mostrasse pacífico, cenas de conflito e vandalismo foram
vistas por toda parte. Em Brasília, três ministérios foram depredados. No Rio,
62 pessoas ficaram feridas. No interior paulista, um jovem manifestante morreu atropelado
e, em Belém, uma gari perdeu a vida após inalar gás lacrimogêneo lançado pela
polícia.
No calor
de acontecimentos que atingem proporções inéditas desde a redemocratização
brasileira, o filósofo Paulo Arantes desfia, na entrevista a seguir, as
perplexidades do "país do futuro" - que afinal chegou, trazendo
consigo antigas contradições. "A vida no Brasil sem dúvida melhorou, e
muito, nestas duas décadas de ajuste ao capitalismo global. No entanto, ninguém
aguenta mais", afirma o professor aposentado da USP e doutor pela
Universidade de Paris X, Nanterre.
Para
Arantes, nunca é demais lembrar que o Maio de 1968 na França também eclodiu em
um contexto de crescimento econômico, pleno emprego e políticas de bem-estar
social. Comparação que, no entanto, para por aí. E que se as "jornadas de
junho" nacionais, como o filósofo as chama, referenciam-se de fato em
rebeliões altermundistas como a de Seattle-1999 ou de Nova York-2011, encontram
no Brasil ambiente ainda mais explosivo, "tamanha a desagregação social em
que nos enfiamos". E avisa: para evitarmos o risco de uma derivação autoritária, será
preciso que governantes municipais, estaduais e federais deixem de lado suas
"cabeças de planilha" e levem a sério a reivindicação radical de
cidadania expressa nas ruas.
‘Perplexidade’
foi a palavra mais usada na descrição dos últimos acontecimentos em todo o
País. O sr. também ficou surpreso?
É
verdade, só hoje de manhã li pelo menos três artigos confessando
"perplexidade" diante dessas realmente espantosas "jornadas de
junho". Cada um com o seu assombro diante da "mais expressiva,
surpreendente e rápida vitória popular de nossa história", nas palavras do
cientista político Rubens Figueiredo, que atribui a rendição dos governantes locais,
Estado e município, à "potência e capacidade de mobilização das redes
sociais". O que os ideólogos da sociedade em rede estão chamando de
autocomunicação, Kant falaria em uso público da razão. Seja como for, mais um
motivo de espanto. Voltemos às três visões perplexas. O cronista, que admite
não estar entendendo nada e exige a mesma franqueza dos demais, da imprensa,
dos políticos e dos próprios manifestantes; o correspondente internacional, que
talvez tenha vivido anestesiado pela rotina da profissão, cobrindo anos de prosperidade
festejada pelos investidores estrangeiros; o veterano do mundo petista agoniado
pelos sinais alarmantes de fadiga da estratégia de mudanças sem ruptura, com
dez anos de conquistas dentro da ordem e níveis coreanos de aprovação eleitoral
arriscando ir para o vinagre à menor gota d’água.
Como
entender esses sinais, em um contexto de baixo desemprego e de crescimento,
ainda que modesto, na economia?
A vida no
Brasil sem dúvida melhorou, e muito, nestas duas décadas de ajuste ao
capitalismo global. No entanto, ninguém aguenta mais. Essa a dissonância
básica, ainda mais estridente quando o contexto é de baixo desemprego, como
você bem lembrou. Não seja por isso. Sei que a comparação frisa o disparate, mas não custa recordar que o
maior movimento contestatário da segunda metade do século 20, disparado pelo
maio francês de 1968, ocorreu justamente no auge de um ciclo inédito de
crescimento econômico, pleno emprego e Estado social a todo vapor, sendo que
três meses antes da explosão o mais acatado colunista da época publicara um
artigo descrevendo a França como um país entorpecido pela autossatisfação.
A herança do Maio, entretanto, já se disse, é uma herança impossível. E a
moçada do Passe Livre sabe muito bem disto: onde havia um horizonte de
superação, existe uma ratoeira. Essa armadilha é o Brasil do futuro que afinal
chegou. Como disse um poeta, "o horizonte sorri de longe e arreganha os
dentes de perto". Por exemplo, a brilhante dentadura do PM baixando o
porrete no casal de namorados num bar da Av. Paulista.
De que
maneira o Passe Livre, que teve início em 2005, se aproxima e se diferencia dos
movimentos sociais a que estávamos acostumados no Brasil?
O
Movimento Passe Livre, como de resto seus congêneres nascidos da galáxia
altermundista, sobretudo os descendentes da velha tradição da Ação Direta,
discrepa dos movimentos sociais clássicos, para não falar é claro, dos partidos
da esquerda histórica, embora seja igualmente temático como os demais
movimentos, e obviamente de esquerda. É filho de Chiapas, Seattle, etc., das
lutas contra a OMC, Alca & cia. Sua família é por certo a dos autonomistas.
E, embora restrito a um foco único, é maximalista, como estamos vendo agora: a
meta é a tarifa zero. Cuja razoabilidade demonstrada nas suas cartilhas de clareza
igualmente máxima são exemplares como introdução prática à crítica da economia
política. Pelo tênue fio da tarifa é todo o sistema que desaba, do valor da
força de trabalho a caminho de seu local de exploração à violência da cidade
segregada rumo ao colapso ecológico. Simples assim, por isso, fatal, se
alcançar seu destinatário na hora social certa, como parece estar ocorrendo
agora.
Daí a
ressonância de uma causa como a da ‘tarifa zero’, tida como inviável?
Exato. E
são tão afiados no manejo do melhor argumento contra a aberrante insensatez do
atual modelo de transporte coletivo - e socialmente convincentes, como estamos
vendo -, que, em contraste, as planilhas dos governantes parecem, elas sim,
cifras fantasiosas ornamentando o jogo das concessionárias que se conhece. Mas
de tanto levarem às cordas essas raposas das planilhas criativas, a expertise
adquirida no processo foi aos poucos colando, num só personagem, o libertário e
o gestor ideal de políticas públicas "igualitárias". Não estou
insinuando que cedo ou tarde esses jovens estarão operando do outro lado do
balcão - como já o fazem no âmbito da cultura digital, no qual a livre
associação de livres produtores revelou-se o melhor caminho para gerar empreendedores
shumpeterianos e novos formatos de negócios, como se diz no jargão do
capitalismo cognitivo. Não à toa, demonstra-se por a+b que a circulação urbana
planejada à luz de uma tarifa zerada exponenciaria a performance econômica de
uma cidade, e estenderia o direito à cidade. Uma ruptura de época está nos
arrastando para uma outra praia não menos conflagrada e na qual os europeus já
vivem há tempos: onde em torno dessas famigeradas políticas públicas de gestão
de um presente congestionado - da segurança à moradia - um grupo se amotina e
as correspondentes instituições coercitivas fecham o cerco. Por isso na Av.
Paulista um dia é pau outro dia é flor.
Além da
reivindicação ‘irrealista’ da proposta de tarifa zero, fala-se muito sobre o
‘caráter difuso’ dos protestos. O sr. concorda?
Me parece
muito mais insensata a hipótese contrária, de que centenas de milhares de
pessoas ganhem as ruas para pedir a Lua. O engenheiro Lúcio Gregori, secretário
de Transportes na cidade de São Paulo no governo Luiza Erundina, tem dito para
quem quiser ouvir que só a horrenda política tributária no Brasil impede a
gratuidade no transporte coletivo, tão viável quanto o SUS, escolas públicas e
coleta de lixo. Quanto ao "caráter difuso" das demandas, trata-se de
um bordão pejorativo porque, em sua infinita variedade, além de serem de uma
espantosa precisão - nada menos do que tudo, como o Terceiro Estado em 1789
queria tudo por não ser nada -, elas sugerem um limiar que no fundo ainda não
se ousou transpor.
Muitos
têm dito também que as manifestações são o equivalente brasileiro de movimentos
como o da Primavera Árabe e o Occupy Wall Street. A comparação procede?
A Primavera Árabe são outros quinhentos. Salvo a tática de ocupação de um local emblemático e o ímpeto do enfrentamento, nada a ver. Da geopolítica - estão no olho do furacão de uma guerra pela ordem mundial - à mescla de trabalhadores pobres e populações destituídas com uma religião militante e suas violentas divisões sectárias. Já o similar do Occupy americano reproduziu-se por aqui há dois anos, mas passou desapercebido, encoberto pela melhora dos índices de Gini no País. Na Turquia sim, um par de analogias salta aos olhos, porém não mais do que isso, pois estamos falando de um país-membro da Otan e implicado numa guerra civil no vizinho árabe: também um estopim com cara de causa menor, a desfiguração de uma praça entregue à especulação imobiliária, do outro lado da barreira, um governante com altos índices de aprovação e por isso mesmo acometido da apoteose mental que conhecemos bem, enterrado até o pescoço em megaprojetos para lá de duvidosos. Quanto aos Indignados espanhóis, é inegável o ar de família, menos quanto ao desfecho conservador, embora ninguém saiba qual será o nosso, tamanha a desagregação social em que nos enfiamos: uma imponderável deriva à direita pode ocorrer a qualquer momento. O fato é que há mesmo muita "indignação" de um tipo novo nas ruas brasileiras em ebulição, tão nova essa indignação que ousou tocar no santo dos santos, a Copa. E olhe que acompanho futebol desde 1950, nunca vi ninguém se atrever a tamanha profanação. O papa não perde por esperar...
A Primavera Árabe são outros quinhentos. Salvo a tática de ocupação de um local emblemático e o ímpeto do enfrentamento, nada a ver. Da geopolítica - estão no olho do furacão de uma guerra pela ordem mundial - à mescla de trabalhadores pobres e populações destituídas com uma religião militante e suas violentas divisões sectárias. Já o similar do Occupy americano reproduziu-se por aqui há dois anos, mas passou desapercebido, encoberto pela melhora dos índices de Gini no País. Na Turquia sim, um par de analogias salta aos olhos, porém não mais do que isso, pois estamos falando de um país-membro da Otan e implicado numa guerra civil no vizinho árabe: também um estopim com cara de causa menor, a desfiguração de uma praça entregue à especulação imobiliária, do outro lado da barreira, um governante com altos índices de aprovação e por isso mesmo acometido da apoteose mental que conhecemos bem, enterrado até o pescoço em megaprojetos para lá de duvidosos. Quanto aos Indignados espanhóis, é inegável o ar de família, menos quanto ao desfecho conservador, embora ninguém saiba qual será o nosso, tamanha a desagregação social em que nos enfiamos: uma imponderável deriva à direita pode ocorrer a qualquer momento. O fato é que há mesmo muita "indignação" de um tipo novo nas ruas brasileiras em ebulição, tão nova essa indignação que ousou tocar no santo dos santos, a Copa. E olhe que acompanho futebol desde 1950, nunca vi ninguém se atrever a tamanha profanação. O papa não perde por esperar...
A imagem
de estádios de Primeiro Mundo em contraponto a serviços públicos de terceiro
deu força à tal ‘revolta da catraca’?
O estopim
da tarifa também passou por aí, e para além do importante movimento dos
atingidos por megaeventos, alcançou a imaginação da massa infeliz condenada à
catraca: queremos tarifa com padrão Fifa - bem como hospitais, escolas,
creches, no mesmo padrão Fifa de qualidade. Humor popular direto ao ponto,
porém um tantinho inquietante: então seria esse o metro da "cidadania
social" a que se aspira? Luxo e apropriação direta dos fundos públicos? A
proximidade com os Indignados europeus dá mesmo o que pensar. Fica no ar a dúvida:
e se tivermos ingressado finalmente na era dos protestos desengajados - como os
qualificou um sociólogo britânico -, quando protestar se tornou uma questão
estritamente pessoal, e o ativismo, a rigor, um estilo de vida? Em fevereiro de
2003 1 milhão de pessoas foram às ruas na Grã Bretanha em protesto contra a
iminente invasão do Iraque. Recolhidos cartazes e bandeiras, não deixaram
nenhum rastro social ou político pelo caminho, salvo a palavra de ordem famosa
"não em meu nome", isto é, não me envolvam nessa barganha de sangue
por petróleo. Na mesma linha, outro conhecedor da cena inglesa observou que os
europeus que promovem festa e casamento durante os protestos o fazem porque
sabem que as demonstrations só demonstram para os próprios demonstradores.
Quando a maré virou, e a vara de condão da PM "transformou" vândalos
em indignados pacificamente distribuídos por nichos genéricos de demandas, a
narrativa midiática dos acontecimentos não precisou forçar a mão para
desviar-se do gatilho do movimento - e apresentar a manifestação como um fim em
si mesma. Essa a moldura do imortal "está lindo vocês nas ruas".
Essa
alternância entre vandalismo e cidadania foi o que tornou os protestos tão
difíceis de decifrar?
Acho que
há menos mistificação do que supõe a socióloga da FGV Silvia Viana, ao notar,
num ótimo artigo, que são tantas as negativas - "não são só os 20
centavos, não é só o transporte, não é só a Copa..." - que o movimento
parece um protesto por nada. Mas não é o que diz uma jovem manifestante, ao ser
indagada sobre as motivações de sua presença no ato: "Olha, eu não consigo
imaginar uma razão para não estar aqui". O teórico alemão Wolfgang Streek
traduziria um pouco à la bruta: vim consumir política, no caso, repudiar um
sem-número de "produtos", a saber tais e tais políticas públicas que
não me satisfazem. Se não me engano, foi esse o ponto da entrevista do
professor José Garcez Ghirardi (Em Trânsito", 16/6), domingo passado neste
mesmo caderno. Alguém observou que muitas palavras de ordem nos protestos decalcavam
slogans publicitários, a começar pelo "Grande Despertar" de uma marca
de uísque.
E o
próprio ‘vem pra rua’, da propaganda de uma fábrica de automóveis...
Puro agitpub: o autor da boutade acrescentou que se tratava menos de ouvidos treinados por jingles do que casos de detournement espontâneo à maneira dos situacionistas franceses. Mas, e se não for bem assim? À notícia da capitulação, o bom senso tático da esquerda tradicional recomendaria uma pausa para consolidação das conquistas. Parece não ser mais o caso. Nas palavras de um ativista, não só em solidariedade às outras cidades que ainda estão na luta, mas porque uma pauta puxa a outra, "a mobilização não pode parar, a cultura da mobilização não deve parar". Mas precisamos, sim, parar para pensar, antes de celebrar o que quer que seja, salvo a derrota acachapante dos reis da planilha. Um coletivo de estudiosos e militantes da questão social no Brasil poderia muito bem dizer que essa mobilização permanente tem menos a ver com a mobilização total de uma sociedade de consumo do que com a implicação, e o "engajamento", das pessoas arrastadas pelo novo assalariamento vulnerável, que estão ralando e padecendo e no entanto engajadas em duas frentes, a do trabalho que ninguém gosta de ver estropiado por chefias despóticas e avaliações espúrias e a do senso do vínculo social a ser reconquistado que decorre dessas engrenagens desenhadas para infligir sofrimento. Quem sabe não virá também dessa outra fonte de energia social o som e a fúria que se vê nas ruas?
Puro agitpub: o autor da boutade acrescentou que se tratava menos de ouvidos treinados por jingles do que casos de detournement espontâneo à maneira dos situacionistas franceses. Mas, e se não for bem assim? À notícia da capitulação, o bom senso tático da esquerda tradicional recomendaria uma pausa para consolidação das conquistas. Parece não ser mais o caso. Nas palavras de um ativista, não só em solidariedade às outras cidades que ainda estão na luta, mas porque uma pauta puxa a outra, "a mobilização não pode parar, a cultura da mobilização não deve parar". Mas precisamos, sim, parar para pensar, antes de celebrar o que quer que seja, salvo a derrota acachapante dos reis da planilha. Um coletivo de estudiosos e militantes da questão social no Brasil poderia muito bem dizer que essa mobilização permanente tem menos a ver com a mobilização total de uma sociedade de consumo do que com a implicação, e o "engajamento", das pessoas arrastadas pelo novo assalariamento vulnerável, que estão ralando e padecendo e no entanto engajadas em duas frentes, a do trabalho que ninguém gosta de ver estropiado por chefias despóticas e avaliações espúrias e a do senso do vínculo social a ser reconquistado que decorre dessas engrenagens desenhadas para infligir sofrimento. Quem sabe não virá também dessa outra fonte de energia social o som e a fúria que se vê nas ruas?
Do ponto
em que estamos, já é possível vislumbrar em que isso tudo vai dar?
Até agora
mais ou menos cem cidades com manifestações marcadas ou já ocorrendo. Era de
70% de aprovação no Datafolha, segundo consta, o índice do Movimento das
Diretas no seu começo. Como lhe dizer que estou entendendo o que seria
inconcebível dez dias atrás? E olhe que o povo lulista - na acepção precisa que
lhe deu o cientista político André Singer - mal começou a dar o ar de sua
graça: tarifa zero dentro da ordem seria demais para o seu "horizonte de
desejo", para usar a ótima expressão de Wanderley Guilherme? E quando o
desemprego voltar com o tremendo arrocho fiscal pela frente? Deixará de lado a
saída empreendedorista pela ação coletiva? Como reagiria a classe média, que
até agora extravasou seu ressentimento atávico contra um pouco de tudo, na hora
em que a gente diferenciada deixar de ser apenas uma ameaça virtual? Salvo a
Copa, o consenso em torno do Brasil emergente ainda não foi arranhado. Se em algum momento se sentir
sob ataque, reagirá como de hábito, cerrando fileiras em torno de um campo
popular ad referendum, os cenários pré-64 sairão das gavetas mais uma vez, etc.
Muitas dissonâncias portanto nessa unanimidade toda, além do mais fabricada
pelos âncoras transmitindo ao vivo o impensável na pasmaceira dos últimos anos.
Na
sexta-feira, já ficava clara não só a apreensão da Fifa em relação à Copa do
ano que vem, mas a do Comitê Olímpico Internacional sobre a Olimpíada de 2016
no Rio de Janeiro. São preocupações fundadas?
A Copa do
Mundo não está indo para o vinagre apenas porque está ficando cada vez mais
claro o engodo da redenção urbana operada por megaeventos do gênero. A ficha
que caiu agora é o escândalo do seu tremendo custo público alavancando lucros
privados inconcebíveis. Temos um ano pela frente, num cenário de retrocesso
econômico, de volta à ortodoxia do primeiro mandato de Lula, tempo suficiente
para que amadureça a percepção pública do real significado da Lei da Copa, essa sim uma verdadeira lei
de exceção. Veremos de perto, entre outras derrogações e violações, o
exercício da soberania corporativa sobre territórios e populações. Não faltarão
gatilhos para outra onda de manifestações em cascata: tem muita gente com
coceira nos dedos.
O sr.
disse certa vez que o pensamento crítico brasileiro encontrava-se em ‘coma
profundo’. Parafraseando um dos slogans mais cantados nos atuais protestos (‘o
povo acordou’), acha que ele pode despertar agora?
Vasto
assunto. Como o dito pensamento crítico brasileiro prestou relevantes serviços
à inteligência nacional, por que não deixá-lo descansar em paz?
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