Quem une o povo é a causa e não seus líderes
POSTADO ÀS 21:07 EM 23 DE Junho DE 2013
Por Fernando Castilho, do JC Negócios, Especial para o Blog de Jamildo.
Quando a Democracia entra em crise, ensinam os compêndios de ciências sociais, é a política quem resolve. Bom, era assim antes do Facebook e das chamadas mídias sociais. Isso não quer dizer que a internet tenha revogado a Constituição. Mas, como diz o slogan de uma grande companhia de logística, será preciso "entender para atender" o que as pessoas nas ruas estão pedindo.
Não vai ser fácil, não será rápido e não há garantias de que isso vai acontecer. Porque, de novo, à luz da nova história escrita em tempo real a partir de eventos de massa convocados pelas mídias sociais, não podemos comparar o Brasil, uma jovem democracia, com as ditaduras do oriente médio onde a partir de cliques de Iphones ruíram governos e assentaram-se outros que ainda capengam para se afirmar.
E isso explica a dificuldade da presidente Dilma Rousseff em entender o processo. Não apenas ela, mas toda a classe política e até mesmo a mídia que sem saber como cobrir esse evento. Primeiro mostra a quebradeira de um pequeno grupo de vândalos e esquecem as multidões, o que acaba ajudando a que outros grupos se sintam estimulados a, também, criar um “ataque” para que isso entre no ar ao vivo. O que, inadvertidamente, ajuda a fortalecer o discurso de que a classe média deve tirar seus filhos das ruas.
A leitura do discurso da presidente indica isso claramente. Em lugar de reconhecer a total incapacidade de seus serviços de informação de detectar o caldo social que está começando a ferver e da completa inutilidade das sondagens dos institutos de pesquisas que lhe davam (até três semanas atrás) índices de aprovação de mais de 75%, ela seguiu o roteiro: de primeira, advertir que não tolerará a violência. Depois, anunciar um pacote de medidas e, finalmente, convocar uma série de reuniões com prefeitos e governadores. Sim, ela também anunciou estar disposta a conversar com os líderes do movimento.
Começando pelo fim: que líderes? Por acaso ela não sabe que (novamente) à luz da história primeiro o povo se une numa causa e só depois os líderes passam conduzir o processo? E como está claro que ainda não existem líderes ela não pode ter interlocução?
Depois, conversar com quem senhora Rousseff? Pelo que está nos cartazes são esses líderes que a sociedade nas ruas está dizendo que não mais os representam. Assim, debater e encaminhar ações pode, ao contrário, reascender o movimento quando se anunciarem hora e lugar dos encontros. Depois, tentar resolver as demandas postas em cartazes exigirá muito mais dela em termos de decisão política do que os instrumentos que dispõe.
Essa dificuldade da classe política em perceber o que acontece vem do fato dela acreditar, vendo do ponto de vista da política, que a política poderá resolver o conflito. Pode, mas noutro ambiente. Hoje, é insuficiente. Até porque ela tende a querer resolver rápido e, na conversa, cooptar com os líderes. O que vai levar tempo porque, sequer, tem interlocutores.
Não vai dar. Porque isso depois do advento do Facebook é muito perigoso. Tende a ser apresentado ou entendido como a tentativa desonesta de cooptar o movimento e capitalizar isso eleitoralmente já em 2014. Exatamente por ainda ser muito difuso vai exigir tempo para que as teses sejam depuradas.
Mas, isso não quer dizer que vai ficar assim. Pelo fato de, ainda, ser difuso isso não quer dizer que ja não se possa relacionar ou até hierarquizar as demandas.
Isso talvez explique porque a chefe da nação, surpreendida pelo tsunami, tenha dado a ordem aos assessores para ver o que o povo pedia. E que e como a rainha Maria Antonieta do "Se o povo não tem pão, que coma brioches”, tenha oferecido um pacote de medidas quando os assessores lhe disseram que o povo nas ruas pedia pão.
A presidente errou ainda ao tentar jogar para governadores e prefeitos, a responsabilidade de tentar atender essas demandas difusas incorrendo num risco ainda mais grave.
Os governadores vão falar o que? A pauta deles é, exatamente, o que a sociedade está dizendo ser contra nas ruas. E eles tendem a achar que tendo mais dinheiro da União (numa atitude de puro oportunismo) poderão resolver. Como se a crise mostrada nos estados não fosse resultado da política que eles vêm fazendo nas suas gestões e da presidente da República.
O risco dessa solução é quanto o fator Facebook pode representar como ferramenta de poder destrutivo, mil vezes maior que as bombas de efeito moral distribuídas pela policia militar. Em resumo, a invenção de Mark Zuckerberg pode ser o detonador de uma nova onda de protestos se a classe média entender que os governadores estão tentando manipulá-los. O que pode potencializar a força de mobilização dessa massa nas redes.
Vendo a coisa pelo cacoete da reportagem de economia talvez a classe política precise entender que “esfriar” o mercado tentando identificar os possíveis líderes e cooptá-los mirando, já, as próximas eleições não seja uma boa ideia. A bem da verdade, isso tem chances muito diminutas de dar certo e muitas chances de dar errado.
Mas, não podemos visualizar o que as ruas pedem? Podemos. Talvez até já possamos relaciona-los: Fim da corrupção, rejeição da PEC 37, redirecionamento de maior volume de recursos para a saúde, reorganização da divisão dos recursos da educação, melhor gestão dos investimentos para o transporte de massa contemplando, inclusive, a tese do passe livre e uma ação de transparência cuja vigilância dos desvios possam ser identificados e punidos.
Mas, cabe a pergunta: com esse Congresso, presidido por Renan Calheiros, essa leva de governadores e esses prefeitos eleitos com bases aliadas que, sequer, podem ser listadas, ela pode implementar isso politicamente?
Para ser realista, neste momento e tentando usar os instrumentos que a presidente da República dispõe, as chances são diminutas. O que abre a perspectiva de que vamos continuar vendo essa onda de protestos até que a pauta se afunile e novas lideranças sejam reconhecidas. Lideranças que, inclusive, podem até já estar dentro do universo político ou fora dele na Oposição. Mas isso vai levar um tempo.
E para quem se assusta com tanta pauta e tanta gente falando ao mesmo tempo, sempre é bom lembrar que quando Jarbas Vasconcelos defendeu a convocação de uma Constituinte ninguém levou a sério. Não tinha ainda o chamado caldo social. E que Lindemberg Farias só ficou conhecido como o líder do movimento Fora Color quando o país já pedia isso nas ruas e a imprensa localizava quem perpetrava as compras da Casa da Dinda de forma que ao Congresso só coube fez a parte legal.
Não se pense que a solução dessa nossa crise não será pela política. Será. Mas noutras bases. No fundo, o que se pode dizer é que o custo das passeatas nas ruas ainda não foi precificado. Estamos naquela sala de pregões onde todos falam compram e vendem numa gritaria que, aos leigos, parece inteligível.
O problema é que ainda não podemos identificar quem dá as ordens de compra e as de venda. O que nos impede de saber quem, ao final do pregão, vai levar os lucros embora até já seja possível visualizar quem vai ficar no prejuízo.
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