O Estado de S. Paulo,
1 de junho de 2013.
As forças
retrógrado-petistas
01 de
junho de 2013 | 2h 06
Miguel
Reale Júnior - O Estado de S.Paulo
Em maio
de 2011 foi apresentada no Congresso Nacional a Proposta de Emenda
Constitucional n.º 33 (PEC 33), de iniciativa do deputado Nazareno Fonteles
(PT-PI). Por essa emenda se impõe grave restrição ao poder jurisdicional do
Supremo Tribunal Federal (STF) como forma de combater o "ativismo
judicial". Na justificativa da emenda afirma-se que o STF, sem
legitimidade eleitoral, passou a ser um legislador ativo, pois, indo além da
solução do caso concreto, cria normas invadindo a atribuição reservada aos
parlamentares, os únicos legisladores.
A PEC 33
ficou em "banho-maria" por mais de ano e meio, tendo sido apresentado
na Comissão de Justiça parecer favorável à sua admissibilidade apenas em
dezembro de 2012 e reconhecida sua constitucionalidade em abril do corrente
ano, com publicação da decisão 15 dias atrás.
Dois
fatores foram desencadeadores da agilização do procedimento para apreciação da
PEC: o julgamento do mensalão e a sustação liminar da tramitação do projeto de
lei, aprovado na Câmara dos Deputados, impondo limitação ao uso do Fundo
Partidário e do tempo de televisão aos novos partidos a serem constituídos.
Merece
ser ressaltado o conteúdo autoritário das duas propostas legislativas, que têm
em comum pretender limitar o exercício da democracia, um submetendo o
Judiciário ao Legislativo, o outro criando insegurança à ida de parlamentares
para um novo partido, com efeito imediato durante a própria tramitação, uma
forma insidiosa de estrangular o surgimento de agremiações, garantindo-se, de
outro lado, maior tempo de televisão aos partidos da base governista, como
forma de se tentar perpetuar no poder a coligação entre políticos retrógrados e
petistas que domina o País.
Cabe,
então, uma breve a análise do teor desses dois projetos. A Proposta de Emenda
Constitucional n.º 33/11 constitui uma verdadeira aberração: primeiramente,
pretende-se garantir a intocabilidade das leis consideradas inconstitucionais
pela maioria dos ministros do STF, pois a Constituição passaria a exigir para
decretação da inconstitucionalidade das leis que esse reconhecimento fosse
feito por quatro quintos dos ministros do STF. Assim, apenas se 9 dos 11
ministros entenderem a lei inconstitucional será ela assim reconhecida. Se 8
ministros considerarem inconstitucional a norma, esta permanecerá eficaz, pois
sua inconstitucionalidade foi reconhecida "apenas" por três quartos
dos ministros. Dessa forma se pretende instalar a supremacia do Legislativo,
cujas afrontas à Constituição devem ser perenizadas autorizando-se que lei,
reconhecida inconstitucional pela maioria do STF, permaneça intangida.
Em outro
artigo, a proposta de emenda generosamente permite ao STF criar súmula, também
por quatro quintos dos seus membros, mas que somente terá força vinculante se
tal efeito lhe for outorgado pelo Congresso Nacional. Recebida a comunicação de
prolação da súmula pelo STF, o Congresso terá prazo de 90 dias para deliberar,
em sessão conjunta, por maioria absoluta, sobre o seu efeito vinculante.
Assim, em
matéria de cunho eminentemente jurisdicional como o relativo à interpretação de
norma constitucional tributária, o entendimento, mesmo de quatro quintos do
STF, apenas terá força vinculante para a administração pública se o Congresso
entender de atribuir a tal enunciado esse efeito. A decisão técnico-jurídica do
STF, fruto de decisão de quatro quintos de seus membros, ficará, então, sujeita
ao crivo do Congresso Nacional, o único que, em sua suprema onisciência, poderá
ou não dar força vinculante a uma súmula!
Em outro
dispositivo se chega a mais um absurdo: se o STF reconhecer a
inconstitucionalidade de uma emenda constitucional, como essa mesmo, por
exemplo, tal decisão não terá efeitos imediatos, mas dependerá de apreciação do
Congresso, que julga o julgamento do STF. Se o Congresso rejeitar a decisão do
STF, a matéria será objeto de consulta popular, um plebiscito, para que o povo
diretamente avalie se a emenda constitucional é constitucional ou inconstitucional,
se deve ou não ter eficácia. Avilta-se o STF em favor de um populismo perigoso
ao se submeter questão técnica de inconstitucionalidade à apreciação da
população!
De outra
parte, o Projeto n.º 4.470/2012, já aprovado na Câmara dos Deputados, torna
impossível a transferência dos recursos do Fundo Partidário e do horário de
propaganda eleitoral no rádio e na televisão proporcionalmente ao número de
deputados que venham a integrar o novo partido, com isso desestimulando a
migração de parlamentares para agremiações em formação.
Com toda
a razão se argumenta que o projeto leva ao esvaziamento do direito fundamental
à livre criação de partidos e do pluralismo político, em ofensa ao já decidido
pelo STF em ação direta de inconstitucionalidade, a ADI 4.430.
Assim,
diante do perigo iminente de dano à liberdade política, o ministro Gilmar
Mendes deu liminar para sustar a tramitação do projeto, cujos efeitos nefastos
já se faziam presentes. Foi o bastante para se espalhar a revolta dos
parlamentares governistas em nome de um "espírito de corpo", para
chamar às falas a "honra" do Congresso, pois o STF teria interferido
na apreciação de projeto ainda em votação, intrometendo-se no curso do processo
legislativo.
Cabe ver,
contudo, que o efeito pretendido pela maioria governista de intimidar colegas a
não se transferirem para novas agremiações já se estava consumando no decorrer
do processo legislativo, garantindo-se, pela mera ameaça, o garroteamento de
novos partidos e a satisfação da fome de poder das forças retrógrado-petistas.
Esse quadro autoritário, fruto da aliança dos chefetes
desde ontem com a corporação petista instalada na burocracia, é próprio dos
atuais donos do poder.
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