Retrocesso orçamentário e democrático
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10 Jun 2013
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Gil Castelo Branco
No
mês passado, opiniões do presidente do Supremo Tribunal Federal,
Joaquim Barbosa, manifestadas no meio acadêmico, provocaram reações
imediatas dos presidentes da Câmara e do Senado. Algumas frases, como
"temos partidos de mentirinha", "querem o poder pelo poder" ou "o
Congresso é inteiramente dominado pelo Poder Executivo", despertaram
polêmica, mas refletiram o óbvio.
Exemplo
dessa relação subserviente e até promíscua entre o Legislativo e o
Executivo se dá no Orçamento Geral da União. A cada ano, o Congresso se
apequena e abre mão de suas prerrogativas constitucionais. O Plano
Plurianual (PPA) 2012/2015, aprovado a partir de mensagem encaminhada
pelo Poder Executivo em 2011, definiu as políticas públicas federais com
a finalidade de organizar sua atuação de forma a alcançar eficiência e
eficácia.
A
inovação dessa versão vigente é que o elo entre o PPA e o Orçamento não
é mais a ação orçamentária, papel agora supostamente desempenhado pelas
"iniciativas" constantes do próprio Plano. Ocorre que não existe na Lei
Orçamentária Anual (LOA) a classificação "iniciativa" associada ao
valor autorizado da despesa. No Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa)
constava, somente, em um dos anexos, a associação entre as ações
orçamentárias e as "iniciativas".
Assim
sendo, é uma odisseia verificar se os programas e as ações
orçamentárias são compatíveis com as "iniciativas" e metas do PPA.
Travestido de decisão técnica para o aperfeiçoamento da metodologia, o
modelo atual adotou classificações genéricas que muitas vezes não
estabelecem vínculos entre o PPA e a LOA. Dessa forma, passaram a ser
consignadas nas leis orçamentárias dotações "guarda-chuvas", de conteúdo
genérico e sem finalidades e objetivos específicos, em prejuízo da
transparência e do controle social.
À
época, diante das reclamações das Consultorias de Orçamento e
Fiscalização da Câmara e do Senado, por meio da Nota Técnica nº 8, o
Executivo prometeu compensar a perda de informação na LOA com o Plano
Orçamentário (PO), forma infralegal para detalhamento da despesa.
O
Congresso chegou a aprovar dispositivos que regulavam os POs, mas,
infelizmente, o Executivo vetou-os ao sancionar a Lei de Diretrizes
Orçamentárias para 2013. A proposta do Congresso estabelecia que os POs
deveriam permitir o monitoramento da ação governamental pela sociedade. O
governo justificou os vetos dizendo: "O Plano Orçamentário é um
instrumento gerencial, de caráter facultativo, e tem por finalidade
permitir que tanto a elaboração do orçamento quanto o acompanhamento
físico e financeiro da execução ocorram num nível mais detalhado. Os
dispositivos em questão ampliam demasiadamente os objetivos do PO, de
tal forma que seria inexequível abarcar todas as situações ali
previstas". Essa justificativa se revelou uma falácia.
A
promessa de esmiuçar as despesas via POs não foi cumprida. Consulta
simples ao Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), da
Secretaria do Tesouro Nacional, evidencia que até agora o detalhamento
dos POs é pífio. Da despesa global orçamentária para 2013,98% estão
classificadas como "não atribuído" a qualquer PO.
Paralelamente,
além das dificuldades para acompanhar a execução dos programas e ações
que oficialmente existem, são inúmeros os "programas fantasia"
anunciados com pompa e ufanismo pelo governo, mas sem relação direta com
as classificações, programas e metas constantes do PPA 2012/2015. Nesse
caso estão alcunhas como Brasil Sem Miséria, Brasil Carinhoso, Mais
Educação, Saúde da Família, Rede Cegonha, Saúde Não Tem Preço, Olhar
Brasil, Brasil Sorridente, Bolsa Verde, Brasil Maior, dentre outras.
As
dificuldades para o monitoramento são tantas que até hoje a Consultoria
de Orçamentos, Fiscalização e Controle do Senado Federal, apesar da
excelente equipe técnica que integra o Siga Brasil, ainda não conseguiu
tornar disponíveis os "Orçamentos Temáticos" para 2013, como os da
Mulher, Segurança Alimentar, Criança, Igualdade Racial, Educação e Meio
Ambiente, o que vinha acontecendo há cerca de 10 anos.
No
caso do "Orçamento Mulher", é clara a perda de transparência. Em 2011, a
Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres contava com quatro
programas finalísticos que possuíam 21 ações vinculadas. No ano passado,
passou a existir um único programa, com 14 ações. Neste ano, o tal
programa tem apenas cinco ações, para desespero do Centro Feminista de
Estudos e Assessoria (CFEMEA), que realiza notável trabalho em favor da
cidadania das mulheres.
É
lamentável que as mudanças tenham prejudicado o controle do dispêndio
federal por parte da sociedade. E, como tudo o que é ruim sempre pode
piorar, a prática opaca já está sendo adotada por Estados e municípios.
Embora o marketing oficial enalteça o acesso à informação e a abertura
dos dados, essas novidades execráveis estão promovendo o retrocesso
democrático e dificultando a participação social e popular.
E,
portanto, necessário que os parlamentares que tenham compromisso com o
controle social criem uma Frente Parlamentar a favor da transparência
orçamentária. Afinal, já basta a babel constituída pelos "três
orçamentos existentes", representados pela LOA, pelos restos a pagar
bilionários e pelos créditos extraordinários criados por medida
provisória no apagar das luzes do ano passado.
É
provável que alguns deputados e senadores nem sequer tenham a dimensão
das dificuldades causadas pelas alterações no PPA e na LOA, com as quais
acabaram concordando ao não derrubar os vetos. No entanto, alertados
como estão pelas consultorias da Câmara e do Senado, além das entidades
que acompanham as despesas públicas, caso não tomem alguma providência,
irão confirmar, com o silêncio e a omissão, as opiniões do ministro
Joaquim Barbosa e de grande parcela da sociedade brasileira.
É economista e fundador da organização não-governamental Associação Contas Abertas |
segunda-feira, 10 de junho de 2013
Retrocessso orçamentário e democrático: perigo à vista
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