segunda-feira, 22 de julho de 2013

Justiça Militar: um robusto enclave autoritário

A Justiça Militar de hoje é praticamente a mesma do regime militar. Não é preciso acabar com a JM, mas desvinculá-la do Judiciário e ser uma justiça que julga exclusivamente crimes militares. É inadmissível que a JM Federal continue a julgar civis mas a JM Estadual não a faça. Sem esquecer que os Códigos Penal e Processual Militar são de 1969, auge da repressão política. Chile, Argentina e Uruguai já fizeram reformas nos mesmos. Mas, o Brasil tudo continua como dantes.  Robustos enclaves autoritários. 



Com poucos processos, Justiça Militar é ameaçada de extinção
22 Jul 2013

 

Por Arthur Rosa e Bárbara Pombo | De São Paulo e Brasília

No Tribunal de Justiça Militar de São Paulo, o tempo médio de tramitação de processos na primeira instância foi de 15 meses em 2012. Na segunda, de cinco meses


Quem passa pela rua Dr. Villa Nova, no bairro Vila Buarque, em São Paulo, quase não percebe a presença de um tribunal. Num prédio simples, localizado no número 285, funcionam as duas instâncias da Justiça Militar do Estado de São Paulo. Em Brasília, a sede do Superior Tribunal Militar (STM) também destoa das que abrigam o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF). Se não chamam atenção por suas instalações, essas desconhecidas esferas do Judiciário despertaram a curiosidade do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por seus números: gastos somados de R$ 419 milhões para o julgamento, em 2011, de aproximadamente oito mil processos contra policiais militares e integrantes das Forças Armadas.
Os dados do relatório "Justiça em Números" foram considerados "escandalosos" pelo ministro Joaquim Barbosa, presidente do CNJ e do Supremo. A polêmica surgiu durante o julgamento pelo conselho de um processo disciplinar contra dois juízes do Tribunal de Justiça Militar de Minas Gerais (TJM-MG), acusados de, intencionalmente, perderem o prazo para julgar ações criminais contra policiais militares.
Diante do problema, os conselheiros olharam os números da Justiça Militar Estadual, presente nos Estados do Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais, e do Superior Tribunal Militar (Justiça Militar da União) e constataram um volume pequeno de processos em tramitação (um total de 13,2 mil em 2011, ante os milhões da Justiça Estadual) e de julgamentos. Enquanto um magistrado da Justiça Estadual proferiu 1.392 sentenças ou decisões terminativas naquele ano, o da Justiça Militar Estadual apenas 177.
No caso, os conselheiros só advertiram os juízes mineiros. Apesar da pena branda, o ministro Joaquim Barbosa aproveitou a oportunidade para determinar a criação de grupo de trabalho para elaborar um diagnóstico e dar um veredicto para a Justiça Militar Estadual e a da União.
Uma das saídas cogitadas seria a extinção desses tribunais e a transferência das ações para a Justiça comum. Outra possibilidade seria restringir a atuação da Justiça Militar da União aos tempos de guerra. O grupo de trabalho, composto por seis membros, deve entregar um relatório final até outubro. "O trabalho não significa que estamos descontentes com a Justiça Militar", diz o coordenador do grupo, o conselheiro Wellington Cabral Saraiva, procurador da República.
Diante da repercussão, os dirigentes dessas Cortes - oficiais da Polícia Militar e das Forças Armadas - afinaram seus discursos. Para eles, é preciso, antes de tudo, conhecer a fundo o funcionamento da Justiça Militar Estadual e a da União, que não contam com representantes no CNJ. "Isso é um absurdo. Não se pode verificar a relevância com números frios", diz o presidente do Tribunal de Justiça Militar de São Paulo (TJM-SP), coronel Orlando Eduardo Geraldi, da Polícia Militar paulista.
Os militares argumentam ainda que a extinção desses tribunais traria repercussões negativas às tropas. A resposta rápida às infrações, segundo eles, repercute e tem um efeito preventivo grande. "A transferência dos casos para a Justiça comum transformaria as Forças Armadas em bandos", afirma o general Raymundo Nonato de Cerqueira Filho, presidente do STM desde março de 2010.
Para o coronel Geraldi, é preciso levar em consideração o efeito da demora dentro da tropa. A Justiça Militar paulista, de acordo com ele, é célere. No ano passado, o tempo médio de tramitação dos processos na primeira instância foi de 15 meses. Na segunda instância, de cinco meses. "Na Justiça comum, demoraria anos. O juiz militar é o da obediência. O civil, o da liberdade", diz.
Além da demora no julgamento, segundo o presidente do STM, há risco de um juiz civil colocar os crimes militares "na vala comum". Ou seja, considerar o crime de deserção apenas como falta ao trabalho ou julgar insignificante o caso de um militar flagrado dormindo ou com drogas dentro do quartel. "Julgamos com celeridade para manter a hierarquia e disciplina, os pilares básicos das Forças Armadas", afirma.
Em maio, por exemplo, o Superior Tribunal Militar expulsou do Exército nove soldados que dançaram funk ao som do hino nacional dentro de um quartel no Rio Grande do Sul. Os ministros classificaram o ato como "desrespeito e ultraje".
Juízes, defensores públicos e procuradores da área militar defendem, além da manutenção desses tribunais, a ampliação de suas competências. Querem, por exemplo, a análise de crimes de homicídio praticados por militares contra civis. "Em vez de duas décadas, o massacre do Carandiru teria levado quatro anos para ser julgado", afirma o juiz Ronaldo Roth, da 1ª Auditoria Militar de São Paulo.

Para a defensora pública Janete Zdanowski Ricci, há 30 anos atuando na Justiça Militar da União, o CNJ poderia encontrar um caminho alternativo: "Seria um novo modelo para aumentar a competência e elevar o volume de processos", diz.

Maioria dos ministros é das Forças Armadas
22 Jul 2013

Por Bárbara Pombo | De Brasília


Última instância da Justiça Militar da União, o Superior Tribunal Militar (STM) possui 15 ministros civis e militares com o mesmo status e privilégios dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Apesar disso, são desconhecidos, inclusive dentro do Poder Judiciário, do qual fazem parte desde 1934.
Dez dos 15 ministros são militares. O restante, civis. Todos os cargos são vitalícios. Cada um deles tem direito a um salário bruto de R$ 26 mil. Mas os rendimentos líquidos - que variam de R$ 12,6 mil a R$ 17,6 mil - ficam aquém dos salários dos ministros do Supremo e do STJ, cujos rendimentos com descontos chegam a R$ 26 mil. O campo de atuação dos militares, porém, também é menor: julgar recursos contra os integrantes das Forças Armadas (327 mil da Marinha, Exército e Aeronáutica).
Para ser ministro do STM, o militar deve ter a mais alta patente hierárquica. Eles são escolhidos internamente pela cúpula do Exército, Marinha e Aeronáutica também pelo fator antiguidade. Os nomes são submetidos à aprovação do presidente da República e do Senado. A escolha dos civis é política, embora também tenham que passar pelo crivo do Executivo e do Legislativo. São três advogados, um promotor do Ministério Público Militar e um juiz de carreira vindo da primeira instância da Justiça Militar da União.
Nas tardes de terças e quintas-feiras, os 15 ministros se reúnem no segundo andar da sede de 32 mil metros quadrados do Superior Tribunal Militar, situada no centro de Brasília. A função deles é julgar recursos contra decisões da primeira instância, representada por 18 auditorias militares espalhadas pelo país. No salão com móveis de madeira escura e tapete avermelhado, normalmente não há plateia e a sonolência entre os julgadores parece ser inevitável, como testemunhou o Valor em uma sessão de maio.
Além de julgar crimes cometidos pelos 327 mil integrantes das Forças Armadas, os juízes militares ainda têm a incumbência de analisar alguns tipos de infrações de civis, como invasões de áreas militares ou estelionato previdenciário, quando a viúva de um ex-militar falece e os dependentes continuam recebendo a pensão. "Teve gente que lesou o erário em mais de R$ 1 milhão", diz o presidente do STM, general Raymundo Nonato de Cerqueira Filho.

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