Folha de S. Paulo, 6
de abril de 2013.
João Sayad: Taxonomia dos
ratos
Face a
problemas insuperáveis, a ciência classifica.
Médicos
classificam tumores em benignos, malignos, perversos ou dóceis. Zoólogos falam
de baratas pretas, marrons, voadoras, cascudas ou molengas; ratos de rabo
longo, camundongos, ratazanas, roedores urbanos e rurais. O método se chama
taxonomia.
Se é
impossível resolver, extinguir ou explicar, classificamos. O taxonomista é,
antes de tudo, um resignado.
Convido o
leitor a iniciar uma taxonomia da corrupção.
Existe a
corrupção do fiscal, do policial, do oficial de justiça, do perito avaliador,
do inspetor da prefeitura, do parlamentar. Esta é a malversação do tipo
público. E a corrupção do setor privado, obviamente, faz par a cada uma das
classes de corrupção do setor público.
Mas
gêneros, espécies e subespécies ainda não foram bem definidos.
Contribuo,
então, com uma classificação que, mesmo modesta, pode aumentar a produtividade
dos caçadores de ratos, fabricantes de inseticidas e ratoeiras, auditores,
corregedores, promotores, funcionários do Ministério Público, jornalistas e até
gente do terceiro setor que ainda se incomode com o tema.
Dividiria
a corrupção do setor público em dois grandes grupos.
A grande
corrupção (chamemos de corrupção "a la grande") está associada a
investimentos públicos enormes. É o mundo das negociatas impressionantes, das
concessões viciadas, das toneladas de cimento.
O caso
famoso do prédio do Tribunal Regional do Trabalho, na Barra Funda, em São
Paulo, é bom exemplo. O prédio está lá. É grande, espaçoso e funcional. Pode-se
dizer até que é bonito. Custou 160 milhões de reais a mais do que deveria ter
custado. Mas está lá.
O culpado
pelo desvio foi morar em Miami, comprou um monte de carros esporte e voltou
preso. Quem ficou aqui acabou devolvendo em prestações o superfaturamento
praticado. A relação custo-benefício, no final das contas, foi positiva: houve
custo excessivo, mas o prédio, repita-se, ficou pronto.
As
características desse tipo de corrupção são duas: primeiro, o bem público foi
produzido e entregue. Depois, o valor subtraído ficou conhecido e teve limite.
Acabou a obra, acabou o roubo. E os culpados mudam de ramo e nos deixam em paz,
se não forem presos.
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