quarta-feira, 8 de maio de 2013

'Samba do crioulo doido' jurídico e político




 O Globo, 8 de maio de 2013.

Nomeação de Afif por Dilma deixa tucanos contrariados

Acúmulo do ministério com cargo de vice em SP é questionado
Sérgio Roxo

 Apesar de publicamente evitarem o ataque, os tucanos ficaram contrariados com a decisão do vice-governador de São Paulo, Guilherme Afif Domingos, de aceitar o convite da presidente Dilma Rousseff para assumir a Secretaria da Micro e Pequena Empresa.
Para os tucanos, ao assumir o ministério, Afif, um dos principais líderes do PSD, fez um movimento que deixa claro que a legenda criada pelo prefeito Gilberto Kassab estará com o PT tanto na eleição presidencial como na eleição estadual do próximo ano. O mal-estar aumentou porque Alckmin só foi avisado no último sábado por seu vice de que aceitaria o convite.
Internamente, os integrantes do governo estadual consideram que é ilegal a decisão de Afif de assumir a pasta e continuar como vice-governador. Professor de Direito Constitucional da PUC-SP, Carlos Gonçalves Jr. diz que o acúmulo viola o artigo 42 da Constituição do estado de São Paulo, que fala que "perderá o mandato o governador que assumir outro cargo ou função na administração pública".
- O que se aplica ao governador se aplica ao vice neste caso - defende.
Ainda na avaliação do professor, caberia à Assembleia Legislativa decidir pela perda do cargo. Ele destaca, porém, que esse caminho não está expresso e haveria necessidade de uma complementação legislativa.
Procurado ontem para comentar a sua situação, Afif disse que só dará entrevista amanhã, dia de sua posse no ministério. A assessoria do vice-governador informou que ele não vê impedimento legal para acumular os dois cargos.
O ex-governador de São Paulo Cláudio Lembo, que é professor de Direito Constitucional, foi procurado pelo político do PSD para saber se poderia seguir como vice.
- Vice não é cargo. É expectativa. O vice não é nada. Não tenho dúvida de que ele pode continuar - disse Lembo.
Na avaliação do ex-governador, quando Alckmin for ao exterior, basta Afif se licenciar do ministério e assumir o comando do estado. De acordo com um tucano, para evitar essa saia-justa, Afif chegou a pedir para ser avisado com antecedência quando o governador viajar para poder também deixar o país. O pedido não foi aceito.
Publicamente, lideranças tucanas atacaram o governo federal, mas evitaram farpas a Afif e ao PSD. O líder do partido no Senado, Aloysio Nunes Ferreira, citou a crítica do coordenador da Câmara de Gestão e Planejamento do governo federal, Jorge Gerdau, ao número de ministérios existentes no país.
- Concordo com o doutor Gerdau: a criação do ministério é uma loucura, uma irresponsabilidade e uma burrice. Com essa ressalva, ainda bem que a presidente convocou para esse ministério um homem lúcido e responsável - disse Aloysio.
Ontem, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), possível adversário de Dilma em 2014, rasgou elogios a Afif e atacou a presidente.
- Reconheço que o Afif é alguém que conhece muito esse assunto, e o governador Alckmin já se manifestou pelo partido, cumprimentando-o. O que percebemos é uma ação da presidente da República, o que chamamos de governismo de cooptação, de buscar, com cargos do governo, ampliar cada vez mais sua base. Essa é a lógica que orienta o governo. Uma pessoa como o Afif deveria estar no governo, com as qualidades que tem, desde o começo, não agora, no final, para ajudar a trazer mais partidos para a base - disse Aécio.
Sobre o acúmulo de funções - uma num governo do PSDB e outra no do PT -, o senador mineiro disse que o quadro partidário amplo no Brasil permite esse tipo de "contradição", mas evitou mais comentários sobre a situação.
O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) também atacou Dilma, mas não poupou Afif.
- Errada está a presidente em criar mais uma estrutura desnecessária, ignorando que é responsável por um projeto de nação, não um projeto de partido. Mas errado também está o vice-governador de São Paulo, que cometeu um ato falho ao aceitar de forma oportunista essa missão no governo. ( Colaborou Júnia Gama)



O Estado de S. Paulo, 8 de maio de 2013

Comissão de Ética da Presidência vai analisar dupla função do ministro Afif

Ministério. Resolução do colegiado que fiscaliza procedimentos éticos do alto escalão considera conflito de interesse exercer atividade que "viole o princípio da integral dedicação pelo ocupante de cargo em comissão ou função de confiança"; titular é também vice-governador.
Tânia Monteiro / Brasília

A dupla militância de Guilherme Afif Domingos, que assume amanhã o cargo de ministro da Secretaria da Micro e Pequena Empresa sem renunciar ao posto de vice-governador de São Paulo, cimenta a aliança com o PS D, mas importa para o Palácio do Planalto uma "crise ética". O acúmulo de funções será analisado pela Comissão de Ética Pública da Presidência em reunião do colegiado marcada para o dia 20.
"A matéria poderá vir a ser analisada pela Comissão de Ética", disse ao Estado um dos integrantes da comissão, o advogado Mauro de Azevedo Menezes. "Vamos analisar com cuidado depois que o novo ministro tomar posse e prestar as informações da DGI (Declaração Confidencial de Informações) citando as atividades que pretende exercer e continuar exercendo enquanto estiver no cargo de ministro". Menezes não quis adiantar se considera existir algum tipo de conflito de interesses caso Afif permaneça na dupla função, sob a alegação de que o caso poderá ser analisado pela comissão.
Segundo a resolução número 8 da comissão, é considerado conflito de interesses o exercício de atividade que "viole o princípio da integral dedicação pelo ocupante de cargo em comissão ou função de confiança, que exige a precedência das atribuições do cargo ou função pública sobre quaisquer outras atividades".
A resolução poderá levar Afif a ser questionado pela simultaneidade de atribuições entre o governo federal e o de São Paulo, já que o texto explica que conflito de interesses "independe do recebimento de qualquer retribuição pela autoridade". O vice-governador informou que só se manifestará após a posse.
A regra lembra que autoridade deve abrir mão da atividade ou licenciar-se do cargo "enquanto perdurar a situação passível de suscitar conflito de interesses".
A decisão de Afif manter as duas funções reedita um problema já enfrentado no início do governo Dilma pelo ex-ministro do Trabalho Carlos Lupi, quando decidiu não se afastar da presidência do PDT. Lupi criou um constrangimento para a presidente quando a Comissão de Ética recomendou a sua demissão por conflito ético.
"Fora da caixa". No Planalto, a decisão de Afif de permanecer servindo ao governo tucano em São Paulo e ao governo federal petista não foi considerado um obstáculo para ele assumir o 39.º ministério de Dilma. A presidente estava decidida a "pensar fora da caixa" para trazer o PSD para o governo e tentar, com isso, turbinar o seu tempo de TV na campanha à reeleição em um minuto e 39 segundos, o terceiro maior tempo de propaganda depois do PT e PMDB. Dilma passou por cima até mesmo do fato de Afif querer definir quando tomaria posse. Mesmo convidado no final do ano passado e o ministério tendo sido criado em 28 de março, Afif pediu a Dilma que só o nomeasse em maio. Ela concordou. Dilma teria exigido, no entanto, dedicação integral ao ministério, sem se dividir com os cargos de vice-governador.
A decisão de permanecer vice-governador de São Paulo foi informada à presidente Dilma e entendida como de foro íntimo. No entanto, se houver algum empeci lho criado pela Comissão de Ética, o tema terá de ser enfrentado por Afif, sem interferência do gabinete presidencial, segundo interlocutores de Dilma.
Dilma já enfrentou vários problemas com o colegiado, que a levaram a intervir no órgão, provocando a renúncia do então presidente Sepúlveda Pertence, em setembro do ano passado. O primeiro confronto foi em decorrência da censura ética aplicada ao ex-ministro da Casa Civil Antonio Palocci, que acabou pedindo demissão. Depois o alvo foi o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, por conta de consultorias prestadas a empresas. Por último, houve a sugestão da demissão de Lupi.

Para lembrar
Antes, Dilma não tinha "biografia"
Ao aceitar assumir o novo ministério, Guilherme Afif se disse "muito honrado" com o convite da presidente Dilma Rousseff. Quatro anos antes, porém, a petista foi classificada por ele como alguém sem "biografia política" para presidir o Brasil. "É a mesma coisa que entregar um boeing para quem nunca pilotou um teco-teco", declarou a jornalistas em 2009, ao comentar a candidatura da então ministra à Presidência. Na mesma ocasião, dias depois do apagão em Itaipu, apontou falhas no setor elétrico e alfinetou a gestão de Lula. "Quando você quer politizar setores técnicos, quando quer aparelhar, a consequência é o apagão."
O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) coordenado por Dilma foi por ele batizado de "Plano de Abuso da Credulidade". Criticou, ainda, programas de transferência de renda. Em 1989, ao disputar a Presidência, atacou o excesso de ministérios e defendeu o fechamento de dez pastas. / Lilian Venturini e Luciano Bottini Filho.



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