- | As constituições estaduais são claras: conselheiro do
Tribunal de Contas deve ter “idoneidade moral e reputação ilibada’ Mas o
histórico de parte dos homens responsáveis por zelar pelo dinheiro
público nas 27 unidades da federação permite concluir que a exigência
nem sempre é cumprida ao pé da letra. Pelo menos 29 (15%) dos 189
conselheiros desses órgãos em todo o país são alvo de ações ou
inquéritos penais no Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou carregam no
currículo condenações por improbidade administrativa.
De desvio de recursos dos próprios tribunais a recebimento de propina
para fazer vista grossa na fiscalização de contratos, o leque de
acusações contra os conselheiros é amplo: peculato, corrupção, formação
de quadrilha e fraude em licitações. Ainda assim, os tribunais promovem o
afastamento cautelar dos conselheiros somente em alguns casos.
E não há proibição legal para que continuem no exercício da função. o
levantamento feito pelo GLOBO mostra ainda que as nomeações ocorrem
mesmo quando o postulante ao cargo já tem um histórico de acusações. Em
2002, o então deputado estadual Humberto Melo Bosaipo foi um dos alvos
da Operação Arca de Noé, da Policia Federal, em Mato Grosso, sob
suspeita de participar de um amplo esquema de desvio de dinheiro dos
cofres da Assembleia Legislativa. A quadrilha criava empresas-fantasma
para disputar licitações da Casa.
Denúncia criminal contra Bosaipo foi apresentada pelo MP e aceita pelo
Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Mesmo assim, em dezembro de 2007,
ele foi aprovado pela Assembleia Legislativa para assumir uma vaga de
conselheiro no Tribunal de Contas local. A posse fez que com que
Bosaipo ganhasse direito a foro privilegiado e seus processos fossem
enviados ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), o que atrasou a
tramitação do caso.
Hoje, o conselheiro é réu em 11 ações penais no STJ. Os ministros já
ordenaram seu afastamento do cargo, mas Bosaipo continua recebendo o
salário de R$ 24.117 e tendo direito a foro privilegiado. Advogado do
conselheiro, Antonio Nabor Areias Bulhões diz que as denúncias contra
seu ciente são genéricas. — Não há individualização de conduta.
QUADRILHA DENUNCIADA NO AMAPÁ
Há casos em que investigações apontam que conselheiros se valeram do
cargo para desviar recurso públicos. No Amapá, quatro integrantes do
TCE foram denunciados pelo Ministério Público Federal, em 2010, por
formarem uma quadrilha para agir dentro da Corte. O quarteto é acusado
de receber ajuda de custo indevida.
O esquema seria liderado pelo ex-presidente José Júlio de Miranda Coelho
e envolveria ainda outras duas conselheiras — uma morreu e outra se
aposentou. De acordo com dados da Operação Mãos Limpas, da PF, Coelho
teria sacado, por diversas vezes, recursos em espécie da conta do TCE.
Também é suspeito de emitir passagem em nome do filho com dinheiro
público e pagar salários a servidores fantasmas.
Os quatro conselheiros estão afastados das funções por determinação do
STJ, mas ainda aparecem no site do tribunal como se estivessem na ativa.
Alessandro Brito, advogado de Coelho, rebate as acusações contra seu
cliente. — Houve equívoco da PF na investigação. Não é possível ligar
nenhum saque ao meu cliente.
E não houve uso de passagem pelo filho dele. O cargo de conselheiro
também serve para garantir tratamento diferenciado em ações judiciais.
integrante do Tribunal de Contas do Distrito Federal, Domingos Lamoglia é
o único dos 37 acusados por envolvimento no chamado mensalão do DEM, no
Distrito Federal, esquema que derrubou o ex-governador José Roberto
Arruda, a responder a processo no STJ.
Os outros 36 réus serão julgados pela Justiça do DF. Um processo que
poderia levar à aposentadoria de Lamoglia e acabaria com seu direito a
foro privilegiado se arrasta desde 2009 no TCDF. O conselheiro é acusado
de ser um dos operadores do esquema.
NEPOTISMO LEVA A AÇÃO DO MP EM GOIÁS
Outras denúncias, na esfera administrativa, também mancham a reputação
dos TCEs. Em setembro do ano passado, seis dos sete conselheiros do
tribunal de Goiás foram acusados pelo Ministério Público Federal de
contratar parentes. O TCE-GO informou que os familiares de conselheiros
já foram demitidos.
No caso das condenações por improbidade administrativa, as
irregularidades, em geral, se referem a condutas adotadas em cargos
públicos ocupados antes das nomeações. Nestes casos, o foro é a Justiça
estadual. Para o presidente da Associação Nacional do Ministério
Público de Contas (Ampcon), Diogo Ringenberg, o quadro nada mais é do
que consequência natural da forma pela qual os conselheiros são
escolhidos.
— A maioria dos membros é oriunda da política. A premissa de ter
ilibada conduta não é respeitada na hora das nomeações. |
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