A invasão da USP
O Estado de S. Paulo - 11/10/2013 |
Por
privilegiar argumentos políticos em detrimento do direito positivo, a
decisão da Justiça que negou o pedido de reintegração de posse do prédio
da reitoria da USP, invadido há uma semana, causa apreensão. Decisões
desse tipo fazem tábula rasa da manutenção da ordem e da preservação dos
patrimônios públicos e privados. Há dias, um pequeno grupo de
estudantes arrebentou a machadadas as portas do prédio da Reitoria e
tentou invadir o Conselho Universitário, que estava em sessão, a
pretexto de reivindicar a eleição direta para reitor e gestão
tripartite, com mandatos revogáveis por decisão de assembleias
universitárias.
Trata-se
de uma reivindicação absurda, pois a USP tem de ser gerida com base no
princípio do mérito, por professores que se submeteram a vários
concursos públicos. Além disso, a reivindicação não foi formulada de
modo civilizado - ao contrário, os baderneiros recorreram a machados,
porretes, marretas e pés de cabra, demonstrando como se comportarão caso
alcancem posições de responsabilidade.
Pois
diante dessa truculência, julgando pedido de reintegração de posse, o
juiz Adriano Marcos Laroca, da 12.ª Vara da Fazenda Pública, imputou ao
reitor da USP ter se recusado a "iniciar um debate democrático a
respeito de diversos temas sensíveis à melhoria da qualidade da
Universidade"". Também afirmou que os prejuízos materiais da ocupação
violenta do prédio seriam de "pequena monta". Ora, qualquer depredação
do patrimônio público é crime, independentemente de seu valor. Disse
ainda o magistrado que "nenhuma luta social que não cause qualquer
transtorno e alteração da normalidade não tem força de pressão"
-conceito que a maioria dos cidadãos de bem deste país entenderá como
fronteiriço à incitação da violência e à ação à margem da lei.
Criticou
a mídia e a sociedade, observando que elas teriam sido "amalgamadas,
por longos anos, na tradição de um pensamento autoritário". E argumentou
que, se autorizasse a PM a executar a reintegração de posse, poria em
risco a integridade física de quem invadiu a Reitoria a machadadas.
"Certamente
é muito mais prejudicial à imagem da USP, sendo a universidade mais
importante da América Latina, a desocupação de estudantes de um de seus
prédios com o uso da Tropa de Choque, sem contar possíveis danos à
integridade física dos estudantes, ratificando, mais uma vez, a tradição
marcadamente autoritária da sociedade brasileira e de suas
instituições, que, não conhecendo conflitos sociais e de interesses, ao
invés de resolvê-los pelo debate democrático, lançam mão da repressão",
disse o magistrado.
O
arrazoado tem o valor de uma sentença judicial, mas a aparência de um
inflamado panfleto. Avança sobre matéria que não havia sido colocada sob
julgamento - ao apoiar a tese da eleição direta para reitor - e chega
ao ápice ao criticar o Poder a que serve, ao dizer que "o Judiciário
sofre as agruras de normas editadas em regimes de exceção, absolutamente
antidemocráticas, para a eleição de sua cúpula administrativa".
O
magistrado afirmou ainda que, ao recorrer aos tribunais, a USP
"judicializou uma ocupação política", fazendo com isso "uma opção clara
pelo uso da força", já que as ações de reintegração de posse são
executadas pela PM. A afirmação, partindo de um juiz, é gravíssima, pois
o acesso à Justiça é uma garantia que a Constituição promulgada em 1988
assegura às pessoas físicas e jurídicas, para a proteção de seus
direitos.
Na
realidade, confiando no Estado de Direito, a USP agiu rigorosamente com
base na lei e acabou censurada justamente por quem não só deveria
aplicá-la, mas também fazer aplicar o capítulo da Constituição que trata
dos direitos e garantias fundamentais.
Se
essa decisão não for reformada, o império da lei estará sob risco e
badernas e truculências traves tidas de "manifestações democráticas"
comprometerão a paz social, a ordem pública, o funcionamento das
instituições e a segurança do direito. Tudo sob a proteção da Justiça.
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