sábado, 5 de outubro de 2013

Bernardo Cabral: "(...) poderes que nenhum ditador teve"

Folha de S. Paulo, 5 de outubro de 2013.

Medida provisória é frustração, diz relator
Bernardo Cabral lamenta sobrevivência de mecanismo após recusa do parlamentarismo
DE SÃO PAULO
 
Relator da comissão de sistematização da Constituição de 1988, o ex-senador Bernardo Cabral (PMDB-AM), hoje com 81 anos, diz que guarda duas grandes frustações dos trabalhos daquele período.
A primeira foi não ter conseguido impedir a aprovação da possibilidade de uso de Medida Provisória por parte do presidente da República.
A Medida Provisória, segundo ele, foi pensada para funcionar no sistema parlamentarista, modelo que ele defendeu --e ainda defende--, mas acabou derrotado no plenário.
"Eu disse (...): Se isso ficar no texto será dado ao presidente da República poderes que nenhum ditador teve'", afirma ele. "Infelizmente a minha profecia estava certa".
A outra frustração é com as normas aprovadas que passaram a balizar o processo de reforma agrária. Para Cabral, as regras atuais explicam as invasões, a demora para as desapropriações e as dificuldades para indenizações. "Ficou pior que o Estatuto da Terra do governo militar", diz.
O ex-senador exerceu o papel mais importante da Constituinte depois de Ulysses Gumarães (PMDB-SP), o presidente da Assembleia.
Como aspecto positivo, ele lista o poder do Ministério Público, a liberdade de informação e as garantias fundamentais. "Nenhuma outra constituição tem garantias para a cidadania como a nossa", afirma o então relator.
Segundo Cabral, todas as Constituições anteriores do país começavam tratando do Estado. Já a de 1988 tem como fio condutor e filosófico o ser humano. "O Estado só aparece lá na frente", afirma.
Segundo ele, "catastrofistas" previram na época da promulgação que a Carta não duraria seis meses, porque o país ficariam "ingovernável".
"Não tivemos nenhuma crise política para fechar nenhum dos poderes. A história corrige injustiças", afirma.
Questionado sobre possível falha da Carta em relação ao sistema eleitoral, Cabral argumenta que esse não era um tema considerado constitucional. Para ele, uma reforma política só é viávlel no início de um mandato presidencial, quando há apoio popular.

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