Folha de S. Paulo, 27 de maio de 2011-- editorial.
A caixa-preta do BNDES
Em mais um capítulo da controversa estratégia de apoio do BNDES ao grupo JBS, o banco converteu em ações R$ 3,48 bilhões de créditos (debêntures) contra o grupo, reduzindo no mesmo montante a dívida da empresa.
As debêntures foram emitidas em 2009 para financiar as aquisições da Pilgrim's americana e de frigoríficos no Brasil. Deveriam ter sido trocadas por ações da JBS USA quando fosse aberto o capital da empresa nos EUA.
Como isso não ocorreu, o BNDES converteu os papéis em ações da própria JBS. Com a conversão, a parcela do banco na empresa cresceu de 17% para 31%, o que reduziu a parte da família Batista, controladora da empresa, de 54% para 47%, e a dos minoritários, de 28% para menos de 22%.
Uma primeira observação diz respeito ao preço, R$ 7,04 por ação. Um valor bem acima da cotação de mercado no dia anterior ao anúncio, próxima de R$ 5,70.
Com isso, a participação do BNDES resultou inferior à que poderia ter obtido, o que aumentou relativamente a fatia remanescente dos outros acionistas, inclusive a família Batista. Os minoritários, insatisfeitos, desfizeram-se de grande quantidade de ações e, com isso, derrubaram seu preço em 10% nos três dias seguintes.
Entre subscrições de ações e financiamentos, o valor aportado à JBS pelo banco, em dois anos, chega a R$ 10 bilhões. Tudo para criar um "campeão mundial" na área de proteína animal.
É mais um exemplo da questionável política industrial seguida pelo governo. De partida, destaque-se que a escolha de "campeões" vem cercada de nebulosidade e pode ter efeitos danosos.
No caso do setor de carnes, houve clara concentração, com prejuízos para os pecuaristas, que perdem poder na barganha com frigoríficos. Mas não houve ganho nas exportações: as vendas de carne bovina "in natura" continuam no mesmo patamar de 2009.
Outra ressalva é que o BNDES apoia setores nos quais o Brasil já é competitivo, em lugar de privilegiar política mais ampla de inovação. Uma das regras de ouro da política industrial bem-sucedida é a incorporação de progresso técnico, o que não está ocorrendo.
O BNDES precisa explicitar os critérios utilizados nessas operações e convencer a sociedade do acerto das prioridades que elegeu a portas fechadas.
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