sábado, 31 de março de 2012

Guerra aos militares e "Justiça de Transição"

Guerra aos militares e “Justiça de transição” contra nossa soberania ameaçam democracia no Brasil

sexta-feira, 30 de março de 2012

Edição do Alerta Total – http://www.alertatotal.net

Por Jorge Serrão
Os filhotes da ditadura na Era Nazipetralha deram um espetáculo dantesco ontem à tarde, atentando violentamente contra a liberdade de oficiais na reserva que foram celebrar, antecipadamente, os 48 anos do movimento civil-militar de 31 de março de 1964. Mais grave que a arruaça anti-democrática promovida por uns 350 jovens inocentes-inúteis em frente à sede do Clube Militar, no Rio de Janeiro, é a motivação internacionalista de todo um movimento para desmoralizar e enfraquecer o poder militar brasileiro.

Pregando a questionável tese da “Justiça de Transição” (aliás, pergunte-se: transição para quê? Para uma ditadura globalitária?) -, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos abriu, oficialmente, uma investigação para apurar por que o Brasil não investigou e puniu os responsáveis pelo assassinato, sob tortura, do jornalista Vladimir Herzog, em 1975. A Advocacia Geral da União terá de analisar a petição número P-859-09 que recebida, de bom grado, pelos revanchistas da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

A tal “Justiça de Transição”, promovida pelos esquemas globalitários contra a soberania do Brasil, pretende que a Comissão da OEA atropele até o Supremo Tribunal Federal Brasileiro – que já reafirmou a validade da Lei de Anistia de 1979 – que perdoou crimes praticados pelos dois lados ideológicos de nossa mal contada história. Atualmente sob hegemonia de ministros indicados pelo governo petista, o STF terá de reiterar que a Anistia vale. Se fizer o contrário, as conseqüências institucionais podem ser gravíssimas para o frágil projeto de consolidação democrática no Brasil.

Ironia da história, desde 1985, são os militares quem são vítimas de golpes. As Forças Armadas são submetidas a um criminoso processo de sucateamento. Seus profissionais são vítimas de um lento e gradual processo de achatamento salarial. Na mídia e no mundo acadêmico dominado pelo dogma esquerdista, os militares são comumente destratados como “ditadores”, “torturadores”, “violadores de direitos humanos” e até como “inúteis”. O Ministério Público, com membros também afetados pelo dogma sinistro, aderiu a tal “Justiça de Transição” e mantém os militares sob fogo intenso.

Toda essa ampla guerra psicológica contra os militares é para enfraquecê-los e impedir que tenham plenas condições de cumprir a missão constitucional de defender a soberania do Brasil. Logo, os verdadeiros inimigos dos militares não são os fanatizados pelas ideologias de esquerda – sejam militantes (como os jovens manipulados de ontem,do tal Levante Popular da Juventude, na Cinelândia) ou outros tipos de meliantes. Eles são agentes conscientes ou inconscientes manipulados pelo sistema do globalitarismo – comandado pela oligarquia financeira transnacional – que tem o projeto de inviabilizar a soberania do Brasil, para mantê-lo como uma colônia de exploração.

Os militares têm obrigação de conhecer e reagir, na verdade, contra seus verdadeiros inimigos – e não contra os agentes do inimigo, como se fez em 1964 (quando não se conhecia, ainda, o verdadeiro inimigo). Os militares (sobretudo os na ativa) têm o dever de mobilizar os segmentos esclarecidos da sociedade brasileira para que conheçam, entendam e defendam um projeto democrático de valorização e reestruturação das Forças Armadas, para que se cumpra a missão de Defesa da Pátria e da Soberania do Brasil.

Ou fazem isso ou as Forças Armadas vão virar um amontoado de meros funcionários públicos fardados sem razão para existência. Se ou quando isto acontecer, o Brasil terá ido para o caso como Nação – sendo apenas uma sofisticada colônia a serviço do sistema globalitário – a mais escrota ditadura de todos os tempos.

Resumindo a opereta: Militares não têm de dar golpe. Também não lhes basta apenas acusarem o golpe ou aceitarem tudo, passivamente. Entrar no joguinho ideológico é outro pecado mortal que não pode nem deve ser repetido historicamente. Também não devem reeditar o tenentismo – se julgando salvadores da Pátria repleta de apátridas que não querem ser salvos, pois preferem ser colonizados.

A guerra agora é Política – na mais pura acepção do termo – sem a conotação ideológica que o inimigo globalitário tanto gosta de empregar no jogo ilusório de dominação. Militares precisam contar com o apoio real e político dos segmentos esclarecidos da sociedade para que seja desenhado um Projeto de Nação para o Brasil – trabalho que ainda não foi feito pelos ideólatras dogmáticos que infestam nossos podres poderes.

Se tal trabalho Político não for feito – dentro da linha da Ordem para um verdadeiro Progresso -, o Brasil caminhará para uma ruptura institucional de conseqüências imprevisíveis que o manterá como eterna “vanguarda do atraso” (o país do futuro que nunca chega).

Em síntese: Ou agimos agora, para frente, ou vão nos pegar por trás, na próxima curva da história. O golpe dos inimigos já está em marcha...

Vida que segue... Ave atque Vale! Fiquem com Deus.


O Alerta Total tem a missão de praticar um Jornalismo Independente, analítico e provocador de novos valores humanos, pela análise política e estratégica, com conhecimento criativo, informação fidedigna e verdade objetiva.


Jorge Serrão é Jornalista, Radialista, Publicitário e Professor. Editor-chefe do blog e podcast Alerta Total: www.alertatotal.net. Especialista em Política, Economia, Administração Pública e Assuntos Estratégicos.

A ditadura civil-militar


O Globo 31 de março de 2012.
A ditadura civil-militar
Daniel Aarão Reis
Tornou-se um lugar comum chamar o regime político existente entre 1964 e 1979 de "ditadura militar". Trata-se de um exercício de memória, que se mantém graças a diferentes interesses, a hábitos adquiridos e à preguiça intelectual. O problema é que esta memória não contribui para a compreensão da história recente do país e da ditadura em particular.
É inútil esconder a participação de amplos segmentos da população no golpe que instaurou a ditadura, em 1964. É como tapar o sol com a peneira.
As marchas da Família com Deus e pela Liberdade mobilizaram dezenas de milhões de pessoas, de todas as classes sociais, contra o governo João Goulart. A primeira marcha realizou-se em São Paulo, em 19 de março de 1964, reunindo meio milhão de pessoas. Foi convocada em reação ao Comício pelas Reformas que teve lugar uma semana antes, no Rio de Janeiro, com 350 mil pessoas. Depois houve a Marcha da Vitória, para comemorar o triunfo do golpe, no Rio de Janeiro, em 2 de abril. Estiveram ali, no mínimo, a mesma quantidade de pessoas que em São Paulo. Sucederam-se marchas nas capitais dos estados e em cidades menores. Até setembro de 1964, marchou-se sem descanso. Mesmo descontada a tendência humana a aderir à Ordem, trata-se de um impressionante movimento de massas.
Nas marchas desaguaram sentimentos disseminados, entre os quais, e principalmente, o medo, um grande medo.
De que as gentes que marcharam tinham medo?
Tinham medo das anunciadas reformas, que prometiam acabar com o latifúndio e os capitais estrangeiros, conceder o voto aos analfabetos e aos soldados, proteger os assalariados e os inquilinos, mudar os padrões de ensino e aprendizado, expropriar o sistema bancário, estimular a cultura nacional. Se aplicadas, as reformas revolucionariam o país. Por isto entusiasmavam tanto. Mas também metiam medo. Iriam abalar tradições, questionar hierarquias de saber e de poder. E se o país mergulhasse no caos, na negação da religião? Viria o comunismo? O Brasil viraria uma grande Cuba? O espectro do comunismo. Para muitos, a palavra era associada à miséria, à destruição da família e dos valores éticos.
É preciso recuperar a atmosfera da época, os tempos da Guerra Fria. De um lado, os EUA e o chamado mundo livre, ocidental e cristão. De outro, a União Soviética e o mundo socialista. Não havia espaço para meios-termos. A luta do Bem contra o Mal. Para muitos, Jango era o Mal; a ditadura, se fosse o caso, um Bem.
No Brasil, estiveram com as Marchas a maioria dos partidos, lideranças empresariais, políticas e religiosas, e entidades da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Conferência Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB), as direitas. A favor das reformas, uma parte ponderável de sindicatos de trabalhadores urbanos e rurais, alguns partidos, as esquerdas. Difícil dizer quem tinha a maioria. Mas é impossível não ver as multidões - civis - que apoiaram a instauração da ditadura.
A frente que apoiou o golpe era heterogênea. Muitos que dela tomaram parte queriam apenas uma intervenção rápida, brutal, mas rápida. Lideranças civis como Carlos Lacerda, Magalhães Pinto, Adhemar de Barros, Ulysses Guimarães, Juscelino Kubitschek, entre tantos outros, aceitavam que os militares fizessem o trabalho sujo de prender e cassar. Logo depois se retomaria o jogo politico, excluídas as forças de esquerda radicais.
Não foi isso que aconteceu. Para surpresa de muitos, os milicos vieram para ficar. E ficaram longo tempo. Assumiram um protagonismo inesperado. Houve cinco generais-presidentes. Ditadores. Eleitos indiretamente por congressos ameaçados, mas participativos. Os três poderes republicanos eram o Exército, a Marinha e a Aeronáutica. Os militares mandavam e desmandavam. Ocupavam postos no aparelho de segurança, nas empresas estatais e privadas. Choviam as verbas. Os soldos em alta e toda a sorte de mordomias e créditos. Nunca fora tão fácil "sacrificar-se pela Pátria".
E os civis? O que fizeram? Apenas se encolheram? Reprimidos?
A resposta é positiva para os que se opuseram. Também aqui houve diferenças. Mas todos os oposicionistas - moderados ou radicais - sofreram o peso da repressão.
Entretanto, expressivos segmentos apoiaram a ditadura. Houve, é claro, ziguezagues, metamorfoses, ambivalências. Gente que apoiou do início ao fim. Outros aplaudiram a vitória e depois migraram para as oposições. Houve os que vaiaram ou aplaudiram, segundo as circunstâncias. A favor e contra. Sem falar nos que não eram contra nem a favor - muito pelo contrário.
Na história da ditadura, como sempre, a coisa não foi linear, sucedendo-se conjunturas mais e menos favoráveis. Houve um momento de apoio forte - entre 1969 e 1974. Paradoxalmente, os chamados anos de chumbo. Porque foram também, e ao mesmo tempo, anos de ouro para não poucos. O Brasil festejou então a conquista do tricampeonato mundial, em 1970, e os 150 anos de Independência. Quem se importava que as comemorações fossem regidas pela ditadura? É elucidativa a trajetória da Aliança Renovadora Nacional - a Arena, partido criado em 1965 para apoiar o regime. As lideranças civis aí presentes atestam a articulação dos civis no apoio à ditadura. Era "o maior partido do Ocidente", um grande partido. Enquanto existiu, ganhou quase todas as eleições.
Também seria interessante pesquisar as grandes empresas estatais e privadas, os ministérios, as comissões e os conselhos de assessoramento, os cursos de pós-graduação, as universidades, as academias científicas e literárias, os meios de comunicação, a diplomacia, os tribunais. Estiveram ali, colaborando, eminentes personalidades, homens de Bem, alguns seriam mesmo tentados a dizer que estavam acima do Bem e do Mal.
Sem falar no mais triste: enquanto a tortura comia solta nas cadeias, como produto de uma política de Estado, o general Médici era ovacionado nos estádios.
Na segunda metade dos anos 1970, cresceu o movimento pela restauração do regime democrático. Em 1979, os Atos Institucionais foram, afinal, revogados. Deu-se início a um processo de transição democrática, que durou até 1988, quando uma nova Constituição foi aprovada por representantes eleitos. Entre 1979 e 1988, ainda não havia uma democracia constituída, mas já não existia uma ditadura.
Entretanto, a obsessão em caracterizar a ditadura como apenas militar levou, e leva até hoje, a marcar o ano de 1985 como o do fim da ditadura, porque ali se encerrou o mandato do último general-presidente. A ironia é que ele foi sucedido por um politico - José Sarney - que desde o início apoiou o regime, tornando-se ao longo do tempo um de seus principais dirigentes?civis.
Estender a ditadura até 1985 não seria uma incongruência? O adjetivo "militar" o requer.
Ora, desde 1979 o estado de exceção, que existe enquanto os governantes podem editar ou revogar as leis pelo exercício arbitrário de sua vontade, estava encerrado. E não foi preciso esperar 1985 para que não mais existissem presos políticos. Por outro lado, o Poder Judiciário recuperara a autonomia. Desde o início dos anos 1980, passou a haver pluralismo politico-partidário e sindical. Liberdade de expressão e de imprensa. Grandes movimentos puderam ocorrer livremente, como a Campanha das Diretas Já, mobilizando milhões de pessoas entre 1983-1984. Como sustentar que tudo isto acontecia no contexto de uma ditadura? Um equívoco?
Não, não se trata de esclarecer um equívoco. Mas de desvendar uma interessada memória e suas bases de sustentação.
São interessados na memória atual as lideranças e entidades civis que apoiaram a ditadura. Se ela foi "apenas" militar, todas elas passam para o campo das oposições. Desde sempre. Desaparecem os civis que se beneficiaram do regime ditatorial. Os que financiaram a máquina repressiva. Os que celebraram os atos de exceção. O mesmo se pode dizer dos segmentos sociais que, em algum momento, apoiaram a ditadura. E dos que defendem a ideia não demonstrada, mas assumida como verdade, de que a maioria das pessoas sempre fora - e foi - contra a ditadura.
Por essas razões é injusto dizer - outro lugar comum - que o povo não tem memória. Ao contrário, a história atual está saturada de memória. Seletiva e conveniente, como toda memória. No exercício desta absolve-se a sociedade de qualquer tipo de participação nesse triste - e sinistro - processo. Apagam-se as pontes existentes entre a ditadura e os passados próximo e distante, assim como os desdobramentos dela na atual democracia, emblematicamente traduzidos na decisão do Supremo Tribunal Federal em 2010, impedindo a revisão da Lei da Anistia. Varridos para debaixo do tapete os fundamentos sociais e históricos da construção da ditadura.
Enquanto tudo isso prevalecer, a História será uma simples refém da memória, e serão escassas as possibilidades de compreensão das complexas relações entre sociedade e ditadura.

quinta-feira, 29 de março de 2012

Controle civil das prisões militares


O Estado de S. Paulo, 29 de março de 2012.

Controle civil das prisões militares

29 de março de 2012 | 3h 04
Alexandre Barros - O Estado de S.Paulo
"Tendo feito todo o esforço
para guiar os superiores civis
na direção que ele acha certa,
o chefe do Estado-Maior das
Forças Armadas (Joint Chiefs
of Staff) deve aceitar as
decisões do secretário da
Força, do secretário de Defesa
e do presidente como finais
e, daí para adiante, apoiá-lo
perante o Congresso.
A alternativa é a renúncia
(demissão voluntária)"
General Maxwell Taylor,
ex-chefe do Estado-Maior
das Forças Armadas dos
Estados Unidos

No Brasil, vivemos de escaramuças entre civis e militares. Ou é a Comissão da Verdade, ou o revanchismo e, agora, o tema do controle das prisões militares por autoridades civis. Militares, como outros cidadãos quaisquer, nas democracias devem ser controlados pelo poder civil.
Foi o presidente Truman que decidiu jogar as bombas atômicas no Japão. Aos militares coube coordenar sua produção e dizer ao presidente que a arma estava disponível. Mas a responsabilidade de lançá-la e explodi-la foi do presidente. Assim foi feito porque assim é que tem de ser feito numa democracia.
No Brasil vivemos num sistema de relações civis-militares cinzento. Os militares têm sistemas separados para tudo: salários, pensões, assistência médica e punições disciplinares, até prisão em instituições militares. Tudo isso tem raízes históricas em tempos de guerra. Não deviam aplicar-se a tempos de paz.
Os salários são diferentes porque nos tempos em que na Europa só se guerreava na primavera e no verão os soldados mercenários ficavam desempregados durante o resto do ano. Alguns governantes resolveram que eles precisavam ficar fora dos limites das cidades fortificadas porque senão acabavam fazendo arruaças. A maneira funcional de evitar que os soldados sem trabalho atacassem os governantes foi comprar sua docilidade com pagamentos, mesmo quando eles não estavam guerreando.
Dentistas só eram temidos quanto tinham os seus boticões nas mãos e os clientes, sentados na cadeira. Fora isso, eram inofensivos. Os militares, porque armados, eram temidos sempre. E por isso ganharam regalias.
Alguns governantes conseguiram romper essa couraça de privilégios oriundos de situações específicas de guerra e o mais eficiente exemplo foi também o menos edificante. Adolf Hitler conseguiu dominar os militares alemães, que tinham sido a base de formação e de sustentação do Estado prussiano, por meio da formação de forças paralelas aos militares, só que armadas. Primeiros foram as SA e depois as SS. A submissão dos militares, portanto, ocorreu, entre outros motivos, porque Hitler criou forças armadas paralelas que podiam opor-se a eles. Para eliminar a "hitlerização" dos militares trazê-los de volta à democracia o general conde Wolf von Baudissin desenvolveu um trabalho fundamental após o fim da 2.ª Guerra Mundial.
Antes que algum leitor assustado ache que estou promovendo ideias de Hitler, escolhi o exemplo para mostrar como é difícil controlar os militares, sobretudo na ausência de uma tradição político-cultural-constitucional para fazer isso, como é o caso dos Estados Unidos e da Inglaterra. De Gaulle era general e presidente da França e enfrentou a rebelião e o terrorismo dos militares de direita por conta da independência da Argélia.
Mas chega de histórias alienígenas. Concentremo-nos aqui.
As Forças Armadas brasileiras não se envolvem em nenhuma guerra externa (que é para o que elas existem) há mais de cem anos. O envolvimento na 2.ª Guerra Mundial foi mais simbólico do que numérica ou temporalmente significativo, ainda que nos tenha deixado heranças edificantes, e menos edificantes, durante o período da guerra fria.
Agora estamos diante da Comissão da Verdade e da Lei da Anistia. Poderemos resolver isso democraticamente, mas ainda não dá para saber e esta vai sobrepor-se a àquela, ou vice versa. O jogo democrático é que definirá isso.
Agora surgiram os problemas das prisões militares, que o governo civil quer e deve poder inspecionar. Afinal, por que manter as prisões militares em tempos de paz? E mais: cento e tantos anos de paz!
Em algum momento os militares precisarão adaptar-se ao princípio da superioridade civil. E isso inclui permitir a inspeção de prisões militares, em que são postos atrás de grades, entre outros, cidadãos que entraram para as Forças Armadas não porque quisessem, mas porque uma lei os obrigou a prestar o serviço militar. Este não passa de um imposto disfarçado cobrado dos cidadãos maiores de 18 anos, sob forma de trabalho e de renúncia a ganhos e/ou educação, durante um ano. Se vivemos num regime constitucional, não é possível manter encarcerados cidadãos sem terem sido condenados por um tribunal civil. Se a lei permite isso, é hora de mudar a lei.
Eu tive o desprazer de passar um fim de semana estendido (Dia de Todos os Santos e Finados) detido por causa da arbitrariedade de um tenente que resolveu punir-me por eu ter falado com um capitão sem pedir permissão a ele - tenente. Só que não tomei a iniciativa de falar com o capitão, apenas respondi a uma pergunta que ele me fez.
Esse episódio foi suficiente para sentir o peso do que podem ser as arbitrariedades dentro de um quartel, já que a instituição militar não está sujeita a nenhum controle externo independente. Portanto, melhor que não tenhamos prisões militares fora do controle do Judiciário civil.
Prisões são a melhor maneira de tornar as pessoas piores. Não acredito que nenhum dos meus colegas de serviço militar que foram presos tenha de lá saído melhor, nem um pouco.
Se, de todo, por questões políticas, ainda não for possível acabar com as prisões militares em tempo de paz, ao menos que um poder independente do sistema militar possa fiscalizá-las.

Visões distintas sobre a democracia brasileira


Folha de S. Paulo, 29 de março de 2012.

Candido Mendes
TENDÊNCIAS/DEBATES
O ASSUNTO É
DEMOCRACIA BRASILEIRA
Otimismo com o país de Dilma
Há faxina contra a corrupção, uma nova política externa, mais renda e menos clientelismo. Avança a democracia, com o CNJ e com as ações do BC
O ano de 2012 representa, para o governo Dilma, um marco da consolidação indiscutível de uma política de desenvolvimento sustentado, em nítido avanço em comparação com o governo anterior.
E, de saída, há reforço de suas determinantes políticas que evidenciam a consolidação de um presidencialismo de coalizão.
O governo se destaca, de vez, das tentações dos partidos dominantes, avulta sobre o PT e enquadra os sistemas de maiorias disciplinadas, a superar uma etapa do nosso subdesenvolvimento no plano de poder. Ou seja, descartando a política de clientela, na velha acomodação dos ganhadores da hora ao botim dos dinheiros públicos.
Deflagrou-se a faxina contra a corrupção, na amplitude da autonomia institucional outorgada ao Ministério Público e à Polícia Federal. O que avançou, de vez, por aí mesmo, foi a nossa democracia profunda. Há um primeiro controle entre os poderes pelo Conselho Nacional de Justiça e há crescente autonomia do Banco Central na regulação da despesa e, sobretudo, na destinação da poupança pública e no seu socorro ao setor privado.
Só se reforça, por outro lado, o empenho redistributivo da renda nacional pelas expectativas de expansão do salário mínimo.
O ano de 2012 é o desse avanço da riqueza ainda incalculável, não só das bacias petrolíferas oceânicas, mas também das jazidas da região de Linhares (ES), que podem chegar de maneira imediata ao mercado.
O vigor de uma nova política externa traduz esse avanço sobre toda a velha política, amarrada sobre uma visão obsoleta de centros e periferias da América Latina, na força com que vamos ao protagonismo dos Brics e deparamos as relações com a China, na mudança de escala do comércio internacional.
E fora, de vez, dos minipalcos da nossa ação externa, a vigorosa defesa, pelo governo Dilma, da entrada da Palestina nas Nações Unidas ecoou outra expressão do nosso multiculturalismo latente.
Somos o país das maiores minorias sírio-libanesas da atualidade, a convocarmos para um novo alinhamento prospectivo, nesta região crítica do mundo do novo século.
E é desnecessário insistir sobre o avanço da nossa política africana, a partir de Angola ou de Moçambique, a, sobretudo, evidenciar o fracasso das políticas europeias, presas a uma inerte política assistencialista, ocupada com a miséria do continente, em vez de emprestar a ele as mecânicas do desenvolvimento e da sua possível sustentabilidade.
O que, sobretudo, evidencia esse nosso perfil internacional é a definitiva obsolescência do bolivarismo chavista, diante das novas cartas petrolíferas e da criatividade do desempenho da Petrobras na Bolívia.
De toda forma, sobretudo, o que parece ganho, de vez, é uma consciência de mudança brasileira.
Derruba os moralismos clássicos das oposições, bem como os apocalipses da dependência externa de um país a que agora dá conta do gigantismo do seu mercado interno e da consciência de seu advento, que permitiu ao "povo de Lula" chegar à nação de Dilma.
CANDIDO MENDES, 83, é membro do Conselho das Nações Unidas para a Aliança das Civilizações, membro da Academia Brasileira de Letras e da Comissão Brasileira de Justiça e Paz

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DEMOCRACIA BRASILEIRA
Fracassamos
Há despolitização, corrupção nos três Poderes e oligarcas como Sarney. A Nova República fez aniversário, ninguém lembrou. Havia motivo?
Nem o dr. Pangloss, célebre personagem de Voltaire, deve estar satisfeito com os rumos da nossa democracia. Não há otimismo que resista ao cotidiano da política brasileira e ao péssimo funcionamento das instituições.
Imaginava-se, quando ruiu o regime militar, que seria edificado um novo país. Seria a refundação do Brasil. Ledo engano.
Em 1974, Ernesto Geisel falou em distensão. Mas apenas em 1985 terminou o regime militar. Somente três anos depois foi promulgada uma Constituição democrática. No ano seguinte, tivemos a eleição direta para presidente.
Ou seja, 15 anos se passaram entre o início da distensão e a conclusão do processo. É, com certeza, a transição mais longa conhecida na história ocidental. Tão longa que permitiu eliminar as referências políticas do antigo regime. Todos passaram a ser democráticos, opositores do autoritarismo.
A nova roupagem não representou qualquer mudança nos velhos hábitos. Pelo contrário, os egressos da antiga ordem foram gradualmente ocupando os espaços políticos no regime democrático e impondo a sua peculiar forma de fazer política aos que lutaram contra o autoritarismo.
Assim, a nova ordem já nasceu velha, carcomida e corrompida. Os oligarcas passaram a representar, de forma caricata, o papel de democratas sinceros. O melhor (e mais triste) exemplo é o de José Sarney.
Mesmo com o arcabouço legal da Constituição de 1988, a hegemônica presença da velha ordem transformou a democracia em uma farsa.
Se hoje temos liberdades garantidas constitucionalmente (apesar de tantas ameaças autoritárias na última década), algo que não é pouco, principalmente quando analisamos a história do Brasil republicano, o funcionamento dos três Poderes é pífio.
A participação popular se resume ao ato formal de, a cada dois anos, escolher candidatos em um processo marcado pela despolitização. A cada eleição diminui o interesse popular. Os debates são marcados pela discussão vazia. Para preencher a falta de conteúdo, os candidatos espalham dossiês demonizando seus adversários.
O pior é que todo o processo eleitoral é elogiado pelos analistas, quem lembram, no século 21, o conselheiro Acácio. Louvam tudo, chegam até a buscar racionalidade no voto do eleitor.
Dias depois da "festa democrática", voltam a pipocar denúncias de corrupção e casos escabrosos de má administração dos recursos públicos. Como de hábito, ninguém será punido, permitindo a manutenção da indústria da corrupção com a participação ativa dos três Poderes.
Isso tudo, claro, é temperado com o discurso da defesa da democracia. Afinal, no Brasil de hoje, até os corruptos são democratas.
No último dia 15, a Nova República completou 17 anos. Ninguém lembrou do seu aniversário. Também pudera, lembrar para que?
No discurso que fez no dia 15 de janeiro de 1985, logo após a sua eleição pelo colégio eleitoral, Tancredo Neves disse que vinha "para realizar urgentes e corajosas mudanças políticas, sociais e econômicas, indispensáveis ao bem-estar do povo".
Mais do que uma promessa, era um desejo. Tudo não passou de ilusão.
Certos estavam Monteiro Lobato e Euclides da Cunha. Escreveram em uma outra conjuntura, é verdade. Mas, como no Brasil a história está petrificada, eles servem como brilhantes analistas.
Para Lobato, o Brasil "permanece naquele eterno mutismo de peixe". E Euclides arremata: "Este país é organicamente inviável. Deu o que podia de dar: escravidão, alguns atos de heroísmo amalucado, uma república hilariante e por fim o que aí está: a bandalheira sistematizada".
MARCO ANTONIO VILLA, 55, é historiador e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)

terça-feira, 27 de março de 2012

Clube Militar e 1964


O Globo 27 de março de 2012.
Clube Militar faz ato para lembrar golpe de 64
No mesmo dia, haverá protesto contra ditadura

Um mês depois de lançar um manifesto para cobrar da presidente Dilma Rousseff uma postura contra a Comissão da Verdade, o Clube Militar realizará, na próxima quinta-feira, às 15h, no Rio, evento de comemoração aos 48 anos do golpe militar de 1964. No mesmo dia, uma outra manifestação, esta em defesa da Comissão da Verdade e contra o evento no Clube Militar, vai ocorrer na Cinelândia, em frente ao prédio do clube. O ato é organizado por nomes da sociedade civil, como o cineasta Silvio Tendler, e organizações de defesa dos direitos humanos, como o Grupo Tortura Nunca Mais-RJ. Também está prevista a participação de militares cassados pelo golpe de 64, que patrocinaram um manifesto contrário ao do Clube Militar e em defesa da Comissão da Verdade e de Dilma.
O ato no Clube Militar, chamado de "1964 - A Verdade", terá como palestrante o general Luiz Eduardo Rocha Paiva. O militar já deu declarações contra a Comissão da Verdade e sugeriu que Dilma fosse convocada para depor sobre as ações de resistência à ditadura militar.
A presidente Dilma proibiu a comemoração oficial do golpe de 31 de março de 1964 por representantes das Forças Armadas. O Clube Militar, no entanto, antecipou a data e distribuiu os convites, exigindo traje esporte fino para quem comparecer.
- Lamentamos profundamente que tenhamos uma comemoração desta natureza - disse Elizabeth Silveira, do grupo Tortura Nunca Mais.
O presidente do clube, general Renato César Tibau da Costa, não retornou as ligações.