ONU retrata horror em prisões do Brasil
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Relatório, que será levado a Genebra em 2014, ainda condena internações compulsóriasVinicius Sassine
BRASÍLIA
Depois de visita inédita ao Brasil, para inspeção de dez dias em cinco
capitais, uma comitiva da Organização das Nações Unidas (ONU) concluiu
que há excessiva privação da liberdade no país, baixíssima aplicação de
medidas alternativas à prisão e grave deficiência de defensores públicos
para os detentos. O Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Detenção
Arbitrária esteve no Brasil pela primeira vez em 22 anos de existência
e, no relatório com as conclusões preliminares, registra que o país tem
uma das maiores populações carcerárias do mundo.
Chamou
a atenção do grupo a quantidade de detentos provisórios em presídios,
delegacias, centros de detenção de imigrantes e manicômios judiciários:
dentre os 550 mil detentos, 217 mil - quase 40% - aguardam uma decisão
da Justiça, ou seja, não cumprem pena, mas prisões preventivas. Outros
192 mil mandados de prisão ainda precisam ser cumpridos, como consta no
relatório.
O
grupo da ONU também analisou possibilidades de detenções arbitrárias
fora do sistema prisional. Os dois integrantes que estiveram no Brasil
para as inspeções, entre os dias 18 e 28 deste mês, criticaram as
iniciativas de internação compulsória de dependentes do crack. Para o
chileno Roberto Garretón e o ucraniano Vladimir Tochilovsky, as
internações à revelia do usuário e da família ferem leis internacionais e
tratados de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.
O
relatório preliminar do grupo da ONU, já encaminhado a integrantes do
governo da presidente Dilma Rousseff, critica o "confinamento
obrigatório de viciados em crack" em São Paulo e maioria de crianças e
adolescentes entre os recolhidos das ruas do Rio de Janeiro para
tratamento médico obrigatório. Integrantes do grupo dizem ter sido
informados que uma verdadeira operação para "limpar" as ruas está em
curso em razão da Copa do Mundo em 2014 e das Olimpíadas em 2016.
"Há
informações de que agentes da polícia têm como alvo os usuários de
drogas a fim de prendê-los e, muitas vezes, realizam prisões
indiscriminadamente", cita o relatório. "O grupo de trabalho está
seriamente preocupado com a informação de que essas medidas também são
fortemente aplicadas devido a futuros grandes eventos, como a Copa e os
Jogos Olímpicos que o Brasil sediará."
O
grupo da ONU existe desde 1991. Nos países visitados, integrantes fazem
um mapeamento de diferentes situações de detenções arbitrárias, como os
casos de prisões sem determinação judicial, de jornalistas e ativistas
de direitos humanos, de imigrantes e de grupos tradicionalmente
discriminados.
Os
membros da equipe do Escritório das Nações Unidas para os Direitos
Humanos em Genebra, na Suíça, estiveram em Brasília, Rio de Janeiro, São
Paulo, Fortaleza e Campo Grande. Eles se reuniram com os ministros da
Justiça, José Eduardo Cardozo; da Saúde, Alexandre Padilha; e outros
integrantes do primeiro escalão do governo federal. O relatório final
será apresentado ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, em
março de 2014.
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De acordo com as normas do Direito internacional, prisão é exceção, e
não regra. A principal medida provisória no Brasil ainda é a prisão. Os
juízes relutam em adotar medidas alternativas, pois não há mecanismos de
controle dessas medidas - disse Tochilovsky.
A
comitiva também averiguou a situação de pessoas com transtornos mentais
mantidas presas em centros de detenção comuns ou em manicômios
judiciários, realidade mostrada pelo GLOBO em série de reportagens
publicada em fevereiro. Pelo menos 800 pessoas em cumprimento de medida
de segurança, aplicada a acusados considerados inimputáveis em razão de
quadros de loucura, estão em presídios comuns.
Um
hospital de custódia foi visitado em Fortaleza. Em São Paulo, o grupo
da ONU esteve na Unidade Experimental de Saúde. O espaço abriga seis
jovens que, na adolescência, cometeram crimes com grande repercussão.
Depois de completarem 21 anos de idade, para não ganharem a liberdade,
os jovens foram internados compulsoriamente na Unidade Experimental. A
visita foi considerada como "uma das constatações mais graves" da
comitiva. "O grupo está preocupado com a falta de base legal para a
detenção destes indivíduos", cita o relatório preliminar.
O
documento também aponta que muitos hospitais de custódia são utilizados
para "deter viciados em drogas". É o caso do Centro de Tratamento em
Dependência Química Roberto Medeiros, no Rio, um espaço para tortura,
como já constatou o Subcomitê de Prevenção da Tortura da ONU.
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São muitos os doentes mentais nessa condição, e não podemos visitar
todos os presídios, todos os manicômios. Identificamos os lugares mais
significativos, mais ilustrativos - afirmou Roberto Garretón.
Entre
as recomendações que o grupo pretende fazer ao governo brasileiro está a
interrupção das internações compulsórias. A ONU também vai pedir a
ampliação dos quadros de Defensoria Pública nos estados.
Procurado, o Ministério da Justiça só deve se manifestar hoje.
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sexta-feira, 29 de março de 2013
Horror nas prisões brasileiras
O Globo, 29 de março de 2013.
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