Correio Braziliense,
2 de outubro de 2012.
Sexto país mais rico do mundo e o
20º mais violento
|
LUIZ FLÁVIO GOMES
Jurista e professor,
diretor-presidente do Instituto Avante Brasil, foi promotor de Justiça (1980
a 1983) e juiz de Direito (1983 a 1998)
NATÁLIA MACEDO SANZOVO
Advogada, pós-graduanda em ciências penais,
coordenadora e pesquisadora do Instituto Avante Brasil
Oitenta e
nove por cento dos jovens de 18 a 24 anos têm orgulho de ser brasileiros, 76%
acreditam que o Brasil está mudando para melhor e 86% consideram que o país é
importante no mundo hoje (revelou a pesquisa Sonho brasileiro, divulgada em
13/6/11). Razões? Acreditam no futuro de um país promissor. Afinal, detentor
da sexta economia mundial, sede da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de
2016, o Brasil é destaque internacional como polo de investimento,
desenvolvimento e oportunidades.
São
incontestáveis os avanços conquistados nas últimas décadas; porém, não tão
virtuosos como se poderia imaginar, diante dos cenários paradoxais que
revelam um país muito aquém do nível do orgulho nacional juvenil. O brilho de
ostentar a 6ª posição na economia mundial (Relatório do Fundo Monetário
Internacional, 2011) resulta ofuscado com o 73º lugar no ranking
internacional da igualdade social (Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado
à Desigualdade, Idhad, Relatório de Desenvolvimento Humano — Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento, Pnud) e praticamente apagado com a 4ª
posição no ranking das nações com pior distribuição de renda da América
Latina (estudo da ONU sobre cidades latino-americanas).
De que
vale ser o país sede da Copa e das Olimpíadas, com investimentos bilionários
em infraestrutura e construção de estádios (os gastos estimados do mundial de
futebol no Brasil subiram para R$ 27,4 bilhões, segundo estudo divulgado pelo
Tribunal de Contas da União (TCU), se, de acordo com o Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), o Brasil ainda possui 16 milhões de pessoas em
situação de pobreza extrema (ou seja, com renda mensal de até R$ 70)?
Embora a
pesquisa demonstre um sentimento otimista em relação ao Brasil, o país é
extremamente deficiente no tocante à equidade no acesso à saúde, à educação e
à renda, além de figurar como um dos países mais violentos do mundo.
Somente em
2010, foram assassinadas 52.260 pessoas, ou seja, 27,3 mortes por 100 mil
habitantes (de acordo com os dados disponibilizados pelo Datasus, do
Ministério da Saúde). Com toda essa mortandade generalizada e descontrolada,
o Brasil é o 20º país mais homicida do mundo, atrás apenas de Honduras, El
Salvador, Costa do Marfim, Jamaica, Venezuela, Belize, Guatemala, Ilhas
Virgens, São Cristóvão e Nevis, Zâmbia, Uganda, Malauí, Trindade e Tobago,
África do Sul, Lesoto, Colômbia, Congo, República da África Central e
Bahamas.
Note-se
que nenhum dos 19 países mais homicidas do mundo compõe as primeiras
colocações no ranking mundial da economia. Quando observadas suas taxas,
equivalem às piores posições no PIB (por exemplo, Honduras, El Salvador e
Costa do Marfim correspondem, respectivamente, à 109ª, 99ª e 97ª colocações).
A mesma lógica é obtida quando verificadas as posições relativas à violência
nos 10 primeiros países mais ricos do mundo (excetuando-se o Brasil), tendo
em vista que os Estados Unidos, a China, o Japão, a Alemanha, a França, o
Reino Unido, a Itália, a Rússia e o Canadá ocupam, respectivamente, a 102ª,
174ª, 203ª, 192ª, 162ª, 173ª, 182ª, 67ª e 148ª colocações no ranking mundial
da violência.
Ser
economicamente desenvolvido não significa, necessariamente, avanço nas demais
áreas. O Brasil é um país rico, mas não é um país de todos. Continua muito
desigual, miserável, doente, analfabeto e extremamente violento. Para que a
nação alcance níveis europeus de assassinatos, tal como os 10 primeiros
países no ranking mundial da economia, a prioridade deve ser mais investimento
na esfera social, diminuindo as distâncias entre as extremidades.
Contrariando
toda cultura sociológica (Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda etc.),
nossos números revelam que nós não somos (ou não somos ainda) um país
pacífico (ou cordial). Não temos consistência social, ou seja, não existe
massa muscular sociocultural suficiente para justificar que 90% dos jovens
sintam-se orgulhosos do Brasil. É mais uma questão de percepção, de
subjetividade, de esperança, que de razão objetiva.
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário