Folha de S. Paulo, 10
de fevereiro de 2014.
Comissão
quer investigação por militares
Ideia do
grupo que apura crimes da ditadura é obrigar Forças a apresentar nova versão
sobre episódios do período
Colegiado
tem pouco apoio dos militares, que vêm destacando oficiais para acompanhar os
depoimentos
LUCAS
FERRAZ DE SÃO PAULO
A
Comissão Nacional da Verdade quer que as Forças Armadas investiguem os próprios
crimes praticados durante a ditadura (1964-85).
A
proposta, que será discutida hoje em reunião do colegiado em São Paulo, tem o
objetivo de forçar os militares a apresentar nova versão sobre alguns episódios
do período.
Diante
dos empecilhos criados por Exército, Marinha e Aeronáutica nas investigações
dos crimes de lesa humanidade, a decisão visa sobretudo constrangê-los.
Mas não
só. A Folha apurou que a comissão quer dividir responsabilidades nas
investigações, já que não terá todas as respostas sobre os crimes até o fim do
ano, quando conclui seu trabalho.
A
investigação militar, contudo, não anulará outras em curso, até porque
espera-se pouca disposição das Forças Armadas em colaborar.
A
comissão pretende ainda envolver militares na investigação do destino de
arquivos das três Forças. Documentos revelam a existência de acervo
desconhecido com ao menos 1,2 milhão de páginas, mas as Forças dizem não ter
conhecimento dos papéis.
O
argumento é que, como a comissão é ligada à Presidência da República, as Forças
Armadas, por questão hierárquica, deveriam acatar o pedido de investigação.
Pedro
Dallari, coordenador da comissão, não quis falar da proposta que, segundo ele,
não tem procedência.
Desde que
iniciou trabalhos, em 2012, a Comissão da Verdade tem encontrado pouco apoio
dos militares, críticos da atuação do grupo por só olhar a ação do Estado.
Em
encontro dos comissários com Dilma em maio de 2013, a presidente garantiu que
militares não atrapalhariam as investigações. Ela teria chegado a brincar,
dizendo que iria "tocar o rock do terror neles [militares]". Mas a
animosidade não arrefeceu.
Militares
da ativa vêm sendo destacados para acompanhar, às vezes fardados, depoimentos
públicos e privados de militares da reserva convocados pela comissão.
No Rio,
em 2013, o Comando Militar do Leste destacou o tenente-coronel André Luís para
uma sessão que ouviu um militar da reserva acusado de crimes nos anos 1970.
O mesmo
ocorreu no depoimento reservado que o general Álvaro Pinheiro prestou em novembro,
no Rio. Pinheiro apareceu com 16 militares, da ativa e da reserva. E dois
militares da reserva acompanharam o depoimento do coronel reformado do Exército
Carlos Alberto Brilhante Ustra, que chefiou o antigo DOI-Codi paulista de 1970
a 74.
A Folha
questionou o Ministério da Defesa sobre os acompanhamentos e sua motivação, mas
a pasta afirmou que não se pronunciaria. O Exército não respondeu.
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