Elio Gaspari
A histeria dos comissários
Manifestante é manifestante, delinquente é delinquente, bandido é bandido e terrorista é terrorista
O senador Jorge Viana defendeu a aprovação em regime de urgência de um projeto de seu colega petista Paulo Paim que classifica como terrorismo os atos de violência física praticados durante manifestações de rua. Depredações e mesmo desacato à autoridade policial são delitos previstos no Código Penal. Isso para não se mencionar o homicídio do cinegrafista Santiago Andrade.
O projeto petista define assim o ato terrorista:
"Provocar ou difundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou à privação da liberdade de pessoas".
A pena iria de 15 a 30 anos de prisão. Se a ação resultar em morte, sobe de 24 a até 30 anos. Fica por aí porque esse é o limite máximo da pena de reclusão nas leis brasileiras.
Deixando-se de lado o caráter vago do que seria "provocar ou difundir terror ou pânico generalizado" e a precisão da pena mínima (15 anos de reclusão), pode-se buscar um caso semelhante de histeria, com danos historicamente conhecidos.
Que tal assim?
Será crime "comprometer a segurança nacional, sabotando quaisquer instalações militares, navios, aviões, material utilizável pelas Forças Armadas, ou ainda meios de comunicação e vias de transporte, estaleiros, portos, aeroportos, fábricas, depósitos e outras instalações:
Pena: reclusão de 8 a 30 anos."
Essa era a redação do artigo 11º da Lei de Segurança Nacional, baixada a 21 de outubro de 1969, no auge da ditadura, pouco depois do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick.
A pena mínima para um sabotador de quartel ou aeroporto (imputações específicas) era de 8 anos. Para assalto a banco ou sequestro de avião ela ia de 10 a 24 anos. Nos dois casos, as penas eram inferiores às que prevê o surto petista. Caso o delito resultasse em morte, a pena seria de fuzilamento. Apesar de ter havido uma condenação, ninguém foi executado dentro das normas legais.
O comissariado quer expandir a definição de terrorismo precisamente numa época em que sexagenários que militaram em organizações da esquerda armada aborrecem-se quando alguns de seus atos são chamados de ações terroristas. O atentado do aeroporto dos Guararapes, por exemplo, quando explodiu uma bomba no saguão, matando duas pessoas e ferindo 14. Ele ocorreu em 1966, dois anos antes da edição do Ato Institucional nº 5. Oito meses antes do AI-5, um documento do Comando de Libertação Nacional, o Colina, dizia que "o terrorismo, como execução (nas cidades e nos campos) de esbirros da reação, deverá obedecer a um rígido critério político". Assim, quatro meses antes da edição do AI-5 mataram um major alemão que pensavam ser o capitão boliviano que estivera na operação que resultou no assassinato do Che Guevara. Nessa organização militava, com o codinome de Wanda, a doutora Dilma Rousseff. Tinha seus 20 anos e nunca foi acusada de ter participado de ação armada.
Como diria Ancelmo Gois: "Calma, gente".
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