sábado, 12 de maio de 2012

Comissão da Verdade


O Globo,  12 de maio de 2012.
"Apontar os responsáveis já será uma punição"
Membros da Comissão da Verdade descartam revanchismo e dizem que foco será esclarecer crimes da ditadura

SÃO PAULO e BRASÍLIA. Nomeados anteontem pela presidente Dilma depois de uma longa negociação que passou por conversas com o PSDB, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e grupos de direitos humanos, os integrantes da Comissão da Verdade reiteram que seu trabalho não será punir, mas esclarecer crimes do passado. "Nosso compromisso não é punir, é descobrir a verdade", disse ontem um deles, José Carlos Dias. Para ele, a Lei da Anistia - que, segundo decisão do Supremo Tribunal Federal impede que qualquer envolvido em crimes cometidos durante o período seja processado - não é empecilho ao grupo dos sete.
- A lei é clara, ninguém será punido. Mas apontar os responsáveis já será uma forma de punição. A informação pode punir - disse o advogado criminalista, que não sabe ao certo porque a investigação da comissão foi estendida ao ano de 1946 e não somente ao período da ditadura militar (1964-1985).
- Nosso foco principal será a ditadura militar.
Por enquanto, os integrantes evitam falar em cronogramas em quem será chamado para depor. Não se sabe, ainda, se os depoimentos serão tornados imediatamente públicos. O grupo se reunirá na semana que vem em Brasília, separadamente e em conjunto, com a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que acompanhará de perto o trabalho.
Aos 76 anos, o ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles, que integrou o grupo Ação Popular contra a ditadura, lembrou que o governo federal já reconheceu centenas de mortos e desaparecidos políticos - 136 listados em uma lei de 1995 e outros cujas famílias receberam indenizações por danos morais e materiais.
- É hora de completar a tarefa. Nós brasileiros nunca mais poderemos considerar que a arbitrariedade é uma solução. Gerações presentes e futuras têm que entender que solução de verdade não inclui violência ou violações de direitos humanos. Se isso acontecer, terá sido lindo - afirmou, negando que haja qualquer revanchismo contra os militares.
A promessa do grupo e da presidente Dilma Rousseff, de realizar buscas aprofundadas sobre o passado do país animou organizações de direitos humanos.
- O Brasil, com muito atraso, especialmente se comparado a vizinhos como Argentina, Chile, Uruguai e Peru, inicia o seu processo. Esperamos que o trabalho da comissão mobilize de tal maneira a opinião pública e o Judiciário, fazendo com que a Lei da Anistia seja revista. A lei é um obstáculo que impede o Brasil de virar a página - afirma José Miguel Vivanco, diretor para as Américas da Human Rights Watch.
Peter Hakim, presidente do Diálogo InterAmericano, também acredita que o resultado do que for apurado possa surpreender.
- No Chile e na Argentina comissões semelhantes começaram de forma tímida, também com caráter sem punição e a coisa foi mudando, acho que seria um sinal de amadurecimento do Brasil se acontecesse o mesmo - salientou.
Militante de direitos humanos e ex-presa política, Amélia de Almeida Teles, a Amelinha, se diz "esperançosa" com a comissão, mas acredita que o trabalho será limitado por seu caráter não punitivo. Mas ela viu como positiva a maioria das sete indicações.
Amélia Teles e sua irmã Criméia de Almeida, ex-guerrilheira do Araguaia, lembraram que o ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça defendeu o Estado brasileiro no julgamento do caso da Guerrilha do Araguaia na Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA em 2010. A Corte Interamericana determinou que o governo brasileiro investigasse as mortes e localizasse os corpos.
- O argumento dele é de que os torturadores estavam anistiados. A posição desses membros a gente ainda não sabe qual será.

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