sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Farra de longa data

correio braziliense 10 dezembro 2010

Farra do Orçamento continua


Visão do Correio
A descoberta de novo esquema destinado a fraudar o Orçamento recoloca na pauta de discussões debate que se arrasta há quase duas décadas. Trata-se da fiscalização dos recursos públicos liberados em decorrência de emendas individuais de parlamentares. Não se discute o princípio que norteou a criação do instrumento que dá ao deputado e ao senador o poder de destinar parte do montante da receita da União para pequenas obras de interesse do município.
É o caso de quadras esportivas, postos de saúde, pavimentação de ruas, melhorias habitacionais, patrulhas mecanizadas, eventos culturais. Compras de pequeno vulto também figuram na franquia. Ambulâncias constam com frequência entre os itens adquiridos. Acredita-se que ninguém conhece (ou deveria conhecer) melhor as urgências da comunidade que o representante eleito.
Entre o ideal e o real, porém, abre-se abismo profundo. Em 1993, com o escândalo dos Anões do Orçamento, a sociedade se assustou com as manobras fraudulentas que desviavam verbas de emendas para o bolso de João Alves e respectiva quadrilha montada no Legislativo. Parte do dinheiro era aplicada em obras inconclusas. A outra parte, que teoricamente completaria o investimento, seguia outro rumo.
À época, a fiscalização, lenta e falha, não permitia acompanhamento do destino dos impostos postos em mãos nem sempre confiáveis. Agora, porém, a vigilância se sofisticou. A Controladoria-Geral da União (CGU) faz o controle interno. O Tribunal de Contas da União, cujos quadros se ampliaram e modernizaram ao longo dos últimos anos, procede ao controle externo. Imprensa, ONGs e sociedade organizada se encarregam do controle social, que atua sem a participação do Estado. Vale lembrar o papel da internet. A rede de computadores permite o acesso a dados e a informações em tempo real, fato impensável tempos atrás.
Mas, apesar dos avanços, falcatruas continuam a ocorrer com preocupante desenvoltura. Descobriu-se esta semana outro esquema que, aparentemente, não estreou agora. O parlamentar apresenta emenda a fim de reservar recursos do Orçamento para promoção de shows, festivais ou eventos similares. Com a autorização do respectivo ministério, a verba é destinada a entidade intermediária (inexistente ou de protegido do parlamentar). Por fim, é repassada a empresa quase sempre de laranjas e com endereço fictício.
Não é por acaso que a previsão de verba para promoção de eventos deu salto de 2.351% em 2010 — de R$ 32,6 milhões para R$ 798,8 milhões. Os números mostram a imperiosa necessidade de fechar os ralos por onde escoa o dinheiro público. Impõem-se medidas rigorosas. Uma delas: impedir que entidades privadas recebam recursos de emendas parlamentares. Outra: dar agilidade à fiscalização. A tramitação de processos leva anos. Quando chega ao término, a aplicação da pena torna-se difícil ou impossível. A impunidade, convém lembrar, é convite irresistível para a corrupção.

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