'Jeitinho brasileiro': 82%
acham que maioria pretende tirar vantagem, diz pesquisa
- Levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) revela percepção da população sobre o tema
Leticia
Fernandes
Publicado:
11/03/14 - 7h00
Atualizado:
11/03/14 - 8h54
Pesquisa
analisa 'jeitinho brasileiro' Arte/O Globo
RIO -
Vivemos em uma sociedade dividida entre malandros e manés? O cultuado
"jeitinho brasileiro" costuma ser usado para burlar regras, furar
filas, andar pelo acostamento e sempre se sair melhor do que a pessoa ao lado.
Mesmo quando ela é da sua família, seu amigo, vizinho ou colega de trabalho. É
o que mostra pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI), feita entre
17 e 21 de setembro de 2012, e completada com dados somente divulgados no
início deste ano. A percepção dos entrevistados em relação a forma de agir do
brasileiro reflete o jeito com que tratamos as pessoas, mesmo as mais próximas
do nosso círculo afetivo: 82% acham que a maioria age querendo tirar vantagem,
enquanto só 16% dos entrevistados acham que as pessoas agem de maneira correta.
Embora os dados tenham sido coletados no ano retrasado, a coordenação da
pesquisa diz que um ou dois anos não interferem na alteração do nível de
percepção das pessoas.
- Há
certas imagens sobre o comportamento do brasileiro que permeiam as percepções
das pessoas nas suas relações sociais. A ideia de que o brasileiro sempre burla
normas e determinações para obter o que almeja - e essa é uma definição do
jeitinho - é recorrente. Para a grande maioria dos brasileiros, a busca de
atalhos, soluções facilitadas ou vantagens fazem parte do cotidiano das pessoas
- explica Rachel Meneguello, cientista política da Universidade de Campinas
(Unicamp).
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Quando o
assunto é confiança, o número também é alto: 62% dos brasileiros não têm
nenhuma (29%) ou quase nenhuma confiança (33%) na maioria das pessoas. Os
otimistas, que confiam muito no próximo, são apenas 6%, e os que disseram ter
alguma confiança são 31%.
Quanto
mais próximo é o círculo social, maior é a confiança. A pergunta sobre
familiares teve 93% de respostas positivas, onde os entrevistados disseram
depositar muita (73%) ou alguma confiança em membros da família (20%). Logo
depois, vêm os amigos, que inspiram muita confiança em apenas 18% das pessoas.
Os que disseram ter alguma confiança foram 48%.
A
pesquisa aponta ainda que o Nordeste é a região onde as pessoas mais acreditam
estar sendo passadas para trás. São 89% os entrevistados que acham que os
outros querem tirar vantagem e só 9% acreditam que as pessoas agem de maneira
correta.Em seguida, vem o Sul, com 85% de grau de desconfiança, seguido pelo
Sudeste (81%) e Norte/Centro-Oeste (71%).
O perigo
mora ao lado
Tão
próximos, mas tão distantes: assim percebemos nossos vizinhos em 53% dos casos
analisados. De acordo com a CNI, que entrevistou 2.002 brasileiros de 143 municípios,
mais da metade dos brasileiros desconfia dos moradores da porta ao lado.
Para
Rachel Meneguello, o alto nível de desconfiança mesmo entre pessoas próximas
aponta para a fragilidade das relações sociais:
- Em
contextos em que mesmo entre os grupos mais próximos a relação é frágil,
estamos diante de situações em que o tecido social está esgarçado.
A última
categoria analisada foi a de colegas de trabalho ou escola. Nesta faixa, 44%
das pessoas confiam muito (9%) ou têm alguma confiança (35%) nas pessoas à sua
volta. A desconfiança, aqui, chega a 47%, sendo 22% os que confiam quase nada e
25% os que não têm nenhuma confiança nesse grupo.
No grupo
dos que recebem até um salário-mínimo, a desconfiança aumenta, com 83% dos
entrevistados acreditando que a maioria das pessoas quer tirar vantagem. O
nível só diminui na categoria dos que ganham de 5 a 10 salários-mínimos, mesmo
assim chega aos 77%. Sobre a percepção que o brasileiro tem da sociedade, o
nível de desconfiança é maior entre os mais pobres e os mais ricos. Na faixa de
quem ganha um salário-mínimo, 67% dos entrevistados disseram ter pouca (26%) ou
nenhuma confiança (41%) na maioria das pessoas. No grupo que ganha mais de 10
salários-mínimos, 68% apontaram desconfiança absoluta (39%) ou muita
desconfiança (29%) na maioria das pessoas.
- O que
tem é essa visão de que o brasileiro sempre quer tirar vantagem, ele passa pelo
acostamento, fura fila, não devolve o troco, cola na prova, e isso afeta essa
avaliação. As pessoas podem defender uma sociedade sem corrupção, mas, nessas
pequenas coisas, elas não têm essa ética, e aí você começa a perder confiança.
É uma confiança desconfiada - conta Renato da Fonseca, coordenador da pesquisa.
Entrevistados
com nível superior são os que mais confiam nos outros. Mesmo assim, são apenas
19% os que acreditam que as pessoas agem de forma correta e 80% os que
acreditam que elas querem tirar vantagem.
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