sábado, 27 de abril de 2013

Comissão da Verdade do B

 Blog do Jamildo

Quem tem medo da Comissão da Verdade nos Correios?

POSTADO ÀS 17:28 EM 11 DE Abril DE 2013
Foto: Ricardo Labastier/JC Imagem
O Sindicato dos Trabalhadores dos Correios e Telégrafos de Pernambuco (Sintect-PE), em assembleia da classe no último dia 10 de março, aprovou o apoio à Comissão da Memória e Verdade Mércia Albuquerque Ferreira, dedicada a estudar as violações dos Direitos Humanos nos Correios do Recife. Com trabalhos em andamento desde o último mês de janeiro, a comissão ainda não foi formalizada - algo que deve acontecer no próximo dia 25 de abril. Mas já está causando mal-estar.

O objetivo da comissão é apurar os desrespeitos aos Direitos Humanos tanto com funcionários dos Correios como ocorridas dentro do prédio dos Correios. Pois durante todo o período do Regime Militar, o prédio na esquina da Rua do Sol com a Avenida Guararapes, no bairro de Santo Antônio, no centro do Recife, sediava no 6º andar o Serviço Nacional de Informações (SNI), que objetivava "supervisionar e coordenar as atividades de informações".

Na prática, o grupo agia infiltrado nos Correios, com militares trajando crachá e fardas dos Correios, mas a serviço do SNI. E sem que o órgão constasse no organograma dos Correios. Eles censuravam correspondências, em especial de lideranças de oposição ao regime, a exemplo de Dom Hélder Câmara, Miguel Arraes e Cristina Tavares.

O estratégico 6º andar, logo acima do andar onde funcionavam os meios de comunicação da empresa, era impenetrável para os funcionários. Estes, suspeitavam de um movimento estranho, mas demoraram para perceber que seus colegas poderiam ser, na verdade, militares infiltrados.

À época, esta regional dos Correios era liderada por Clidenor de Moura Lima, Coronel da Infantaria do Exército, que viria a ser citado como torturador no livro "Brasil Nunca Mais", de Paulo Evaristo Arns.

E hoje, atuando desde janeiro na sede do Sindicato dos trabalhadores dos Correios, a Comissão da Verdade Mércia Albuquerque está sofrendo velada retaliação da empresa. Com ato de formalização da comissão marcado para às 18h do dia 25 de abril, a comissão solicitou à empresa o auditório do Centro Cultural Correios para a realização da cerimônia. Após espera de dois meses, os membros da comissão tiveram uma resposta negativa.

"A empresa informou que não reconhece a nossa comissão, porque quem teria o poder de criar uma comissão do tipo seria o Governo federal ou a administração central [da empresa]. Eles alegam isso com base na Lei 12.528, que criou a Comissão Nacional da Verdade", afirma Arnaldo Travassos, membro da comissão. "Ao mesmo tempo, a empresa se coloca à disposição 'para o que a Comissão precisar', mas se nega a ceder um auditório. É contraditório", analisa.

A Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional Pernambuco (OAB-PE), informou que caso os Correios não cedessem o espaço solicitado, o auditório da Ordem poderia ser utilizado.


Ao lado das também integrantes da comissão Maria das Graças da Costa Bandeira, advogada e prestadora do sindicato há 9 anos; Maria Alves Ferreira de Moraes, funcionária pública dos Correios e diretora do Sintect-PE; Mauro Lapa, fundador e ex-presidente do sindicato, servidor aposentado dos Correios, acredita que a reação dos Correios à criação da comissão tem motivação nas raízes culturais da empresa.

"Desde que era Departamento de Correios e Telégrafos, é o órgão que mais abrigou militares. Desde 1975 os Correios é a empresa que mais demitiu por motivos ligados a greve, mobilização sindical. Somam quase 20 mil demissões", diz Lapa.

E é completado por Maria Alves. "Tínhamos militares em todos os cargos importantes da empresa. Durante a ditadura, todos os presidentes da empresa e das regionais eram militares. Todos os altos cargos eram indicados pelo Regime".

Mauro Lapa afirma que tanto os presidentes quanto os diretores são escolhidos de maneira puramente política. Não há eleição e nem existe mandato. Eles estão lá enquanto é da vontade dos seus superiores e padrinhos.

"Ainda hoje temos gestores que durante a greve de 1986 demitiu toda a diretoria do sindicato, que na época ainda tinha nome de associação. E até ex-funcionários da SNI permanecem por lá", diz Mauro Lapa, logo completado por Maria Alves. "Ainda há perseguição dentro da empresa. Há diversos inquéritos administrativos na empresa, assim como gestores já condenados por danos morais", afirma.

Mas Maria das Graças espera uma mudança de postura da empresa. "Esperamos que eles colaborem, não andem na contramão da história política do País". O Blog de Jamildo conversou com a assessoria dos Correios, que prometeu uma resposta ao Blog, que ainda não foi enviada.
Leia também: Governo permite aparelhamento político nos Correios

Comissão da Memória e Verdade Mércia Albuquerque Ferreira foi criada nos moldes da Comissão Nacional da Verdade (CNV), com sete membros na comissão central, podendo abrir subcomissões para pesquisas específicas, de acordo com o desenvolvimento dos trabalhos. As comissões da verdade nacional e estadual já se colocaram à disposição.

"Já conversamos com a CNV e a Comissão Estadual já afirmou que nos dará suporte. Manteremos reuniões e já nos foi passado um material para nos ajudar", afirma Mauro Lapa, também membro da comissão.

O grupo ainda está em fase inicial de trabalhos, mas já está de olho no arquivo dos Correios, que guarda documentação dos últimos 50 anos, no bairro da Iputinga e que deverá fornecer material para a primeira fase da pesquisa, a documental. Em seguida devem ser realizadas entrevistas, depoimentos. O grupo tem até meados de setembro para elaborar um relatório e enviar para a comissão estadual. Esta, por sua vez, deverá enviá-lo para a CNV.

O grupo afirma que o trabalho que está sendo feito é totalmente voluntário. O dinheiro que o Sintect-PE coloca na Comissão da Memória e Verdade Mércia Albuquerque Ferreira é destinado unicamente para compra de equipamentos para auxiliar os trabalhos da comissão e, se necessário, contratação de funcionários.

Mércia Albuquerque Ferreira, homenageada no nome da comissão, foi notável advogada de presos políticos, a exemplo de Gregório Bezerra, durante o período da Ditadura Militar no Brasil.

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