Folha de S. Paulo, 11
de agosto de 2012.
Papéis de
crise do governo Sarney foram destruídos
Documentos
indicariam quem ordenou a invasão do Exército à Companhia Siderúrgica Nacional,
no RJ
Greve de
1988 terminou com três metalúrgicos mortos; destruição de documentos era
permitida, diz Exército
RUBENS
VALENTE
DE BRASÍLIA
DE BRASÍLIA
Documentos
sigilosos que poderiam elucidar uma das principais crises militares do governo
José Sarney (1985-1990) foram destruídos, de acordo com o Comando do Exército
brasileiro.
Em
resposta a um pedido feito pela Folha por meio da Lei de Acesso à Informação, o
Exército informou que foram eliminados todos os relatórios produzidos por sua
área de inteligência sobre a invasão, pelas Forças Armadas, da sede da CSN
(Companhia Siderúrgica Nacional) de Volta Redonda (RJ).
A invasão
foi feita em 9 de outubro de 1988 para encerrar uma greve iniciada dois dias
antes, e culminou na morte a tiros de três metalúrgicos e no ferimento de
dezenas de trabalhadores.
Os papéis
sobre Volta Redonda poderiam solucionar um dos maiores mistérios do episódio:
se, e em que termos, Sarney, hoje presidente do Senado, de fato concordou
pessoalmente com a invasão militar à siderúrgica.
Na edição
de 27 de novembro de 1988, a Folha noticiou que a ordem para a invasão partiu
do próprio presidente, em cumprimento a uma ordem judicial.
No dia
seguinte, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) informou que, se confirmada, a
notícia poderia gerar um pedido de impeachment do então presidente por revelar
"o despreparo" do governo em lidar com a questão.
"Quem
ordenou a invasão é a pergunta que todo mundo faz", afirma Bartolomeu
Citeli, um dos diretores do sindicato na greve de 1988.
"Foi
um ataque violentíssimo, foi uma guerra. E o comandante do Exército não poderia
ter autorizado se não tivesse a autorização do comandante-em-chefe das Forças
Armadas, o presidente [Sarney]", disse o advogado João Nery Campanário,
que na época defendia o sindicato dos metalúrgicos.
LEGALIDADE
Ao saber
pela Folha o que aconteceu com os documentos, Bartolomeu Citeli pediu a
"responsabilização criminal" dos militares.
De acordo
com o Exército, entretanto, a destruição era permitida pela legislação da época
-uma herança da ditadura militar que permitia inclusive destruir os papéis que
atestaram a eliminação dos documentos.
O caso se
assemelha à questão dos papéis sobre a Guerrilha do Araguaia, maior foco armado
contra a ditadura, que o Exército também alegou ter destruído.
Integrantes
da Comissão da Verdade, colegiado criado pelo governo federal para investigar
violações aos direitos humanos entre 1946 e 1988, em especial no regime militar
(1964-1985), têm afirmado que a eliminação de papéis sigilosos sobre o Araguaia
foi ilegal.
Isso
porque não houve o cumprimento de todas as determinações das normas que
possibilitaram a destruição, segundo sustentam os membros da comissão.
Também
foram eliminados os papéis sobre a destruição a bomba de um monumento erguido
pelo arquiteto Oscar Niemeyer em memória dos mortos na invasão da CSN, segundo
o Exército.
Procurado
por meio de sua assessoria, José Sarney não se pronunciou.
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