segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Possibilidade de profunda frustração popular

O Brasil quer mesmo crescer?

Autor(es): Carlos R. Schneider
Valor Econômico - 02/09/2013
 

A resposta a essa pergunta parece óbvia e leva a outra indagação: por que não conseguimos crescer de forma consistente, mesmo com todas as riquezas que a natureza nos deu? A resposta é simples: mesmo que tenhamos condições favoráveis, para colher é preciso plantar. E o Brasil tem plantado muito pouco para querer colher crescimento acelerado.
Não tem havido vontade política suficiente para fazermos os ajustes estruturais que permitam reduzir o Custo Brasil e restabelecer a competitividade da economia deste país, para além das commodities, em setores que alavancam a produtividade - fator fundamental para dinamizar de forma saudável as relações de troca e a capacidade produtiva brasileira.
Quando a economia vai bem, nos esquecemos das reformas necessárias. Quando vai mal, alegamos necessidade de resolver os problemas de curto prazo e não as questões mais profundas que só mostrarão resultados mais à frente. Isso possivelmente nos remete a uma tese inaceitável sob qualquer ponto de vista: de que as coisas precisam piorar muito antes de melhorar.
Fundamental para o encaminhamento de uma solução é o avanço de uma postura de estadista, menor preocupação com as próximas eleições e maior com as próximas gerações, assim como maior demonstração de espírito público por parte dos governantes.
A reforma política, o ajuste fiscal, o aumento da eficiência da gestão pública, a modernização da legislação trabalhista e das leis que regem a administração do Estado são desafios complexos, mas que necessariamente devem ser enfrentados, não apenas para caminharmos em direção a uma sociedade desenvolvida, mas também para acompanharmos a evolução de outros países emergentes que vêm se destacando se comparados a nós. Para isso, é fundamental que saibamos nos articular e pressionar os governantes por esses ajustes. Até porque são as manifestações da sociedade que movem a classe política, desde que sejam suficientemente representativas.
O tripé que tem sustentado o crescimento recente do país está esgotando o seu poder de fogo. Os preços das commodities pararam de subir e até estão caindo; a possibilidade de absorção de novos contingentes de mão de obra está esbarrando na baixa qualificação de um percentual já reduzido da população ainda desempregada; e a viabilidade de continuarmos alavancando crescimento com consumo fica mais difícil na medida em que o nível de endividamento das famílias vem se aproximando muito de um limite prudencial. O consumo das famílias brasileiras já representa mais de 60% do PIB e as suas dívidas mais que dobraram nos últimos cinco anos, comprometendo acima de 40% da renda.
Segundo os economistas Fabio Giambiagi e Armando Castelar, entre 2005 e 2011 as vendas do comércio cresceram a uma taxa de 8,1% ao ano, enquanto a produção industrial não avançou mais de 2,4% em média. A falta de competitividade da empresa nacional permitiu o avanço dos importados. No caso de serviços, que não podem ser importados, o aumento do consumo pressiona a inflação. É o que estamos vendo.
O consumo só será importante para estimular crescimento econômico no longo prazo se o nível de investimento na economia estiver adequado. E é nesse ponto, principalmente, que estamos falhando.
Alberto Ramos, ex-economista do FMI, afirma que as economias latino-americanas precisam fazer reformas para alavancar a capacidade de investimento se quiserem aproximar a taxa de crescimento à dos emergentes asiáticos. Essa recomendação é ainda mais importante para o Brasil, que vem ficando bem atrás de vizinhos como Peru, Chile, Colômbia e México - em níveis de investimento e de crescimento.
Em 2012, a carga tributária no país bateu novo recorde: 36,7% do PIB, apesar das desonerações concedidas para reativar a produção. Segundo o IBPT, a carga de impostos no Brasil cresceu mais do que em qualquer outro país do mundo, afetando negativamente a eficiência geral da economia. Destaca ainda que somente uma reforma tributária que contemple redução e simplificação dos impostos, com uma gestão fiscal mais eficiente, pode promover a competitividade da nação.
Segundo o Banco Mundial, o Brasil é o país que mais trabalho requer para o pagamento de tributos: 2.600 horas por ano, mais que o dobro do segundo colocado que é a Bolívia, com 1080 horas. Contra, por exemplo, a Suíça, com 63 horas, e os Emirados Árabes, com 12 horas.
Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal, afirma que temos um precário, e possivelmente, mais complexo modelo de tributação do consumo do mundo. E as recentes tentativas de simplificar a legislação do ICMS permitem concluir que a guerra fiscal continuará, por falta de sanções legais. A tributação ficará mais complexa e possivelmente ainda restará ao contribuinte pagar uma conta superior a R$ 400 bilhões a serem destinados aos fundos compensatórios previstos na proposta, nos próximos 20 anos. Dizem que nada é tão ruim que não possa piorar.
Certamente a Constituição de 1988, que foi pródiga em estabelecer direitos para diferentes parcelas da sociedade, provocou parte do avanço da carga tributária da casa dos 25% do PIB para os níveis atuais. E, certamente, outra importante explicação é o crescimento da gordura em uma máquina pública que cada vez mais confunde o seu papel de prestar serviços à sociedade com uma realidade em que se transforma num fim em si mesmo: deixa de servir o público para dele servir-se.
A frustração com a falta de reflexos positivos na taxa de crescimento da economia com as reduções na taxa de juros, ocorridas em 2012, reforça ainda mais a convicção de que expansão depende de ajustes que aumentem a eficiência do Estado e da economia.
Se as lideranças da sociedade civil organizada não se articularem para que, junto com as lideranças políticas, se crie um ambiente propício a mudanças mais profundas, logo a sensação de bem-estar da população, gerada por um frágil pleno emprego, se transformará em uma profunda frustração. Desnecessariamente.

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