'Quem torturou Dilma deve estar se torturando'
O Estado de S. Paulo 26 nov 2010
Tânia Monteiro, Leonencio Nossa
Às vésperas de encerrar o mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu fazer as primeiras críticas aos torturadores do regime militar (1964-1985). Em evento ontem da agricultura familiar, ele deixou de lado o tom contemporizador que marcou os discursos sobre a ditadura em seus oito anos no poder para provocar os agentes da repressão, especialmente os que torturaram a então guerrilheira Dilma Rousseff. "Quem torturou ela pensou que tinha acabado com a vida dela na política. Agora, deve estar sendo torturado por dentro", disse.
"Se a Dilma tomou choque, o choque que esse cara está tomando por dentro é de uma grandeza que ele não imagina. Ele vê aquela menina virar mulher, presidenta da República, sem o ódio que ele tinha, mágoa e vingança."
Ao longo dos dois mandatos, Lula não apenas tentou conciliar nos embates sobre a ditadura como evitou conflitos com militares da reserva. A Advocacia-Geral da União (AGU) recorreu três vezes da decisão da Justiça que obrigou o governo a abrir os arquivos das Forças Armadas relativos à guerrilha do Araguaia (1972-1974). Em 24 de outubro de 2004, Lula disse aos comandantes da Aeronáutica, do Exército e da Marinha, no Clube dos Oficiais da Aeronáutica, que não iria abrir arquivos, como o Estado noticiou à época. A reportagem não foi desmentida pelo Planalto. Dois anos depois, a 15 de dezembro de 2006, o presidente afirmou em entrevista coletiva no Clube do Exército que "a ditadura no Brasil não foi tão violenta como no Chile".
Na solenidade de ontem, a uma plateia de pequenos agricultores, Lula fez até mesmo análises sobre a esquerda: "Tem um tipo de esquerda que é a esquerda que vai ao bar, toma uma coca-cola e fica falando mal dos outros, é aquele que não produz, que pede a Deus para nunca chegar ao governo, nunca, porque todas as teorias dele terão que ser colocadas em prática".
O presidente disse que, após conhecer países "socialistas", como a extinta Alemanha Oriental e Cuba, formulou uma "tese". "A minha tese é que a Revolução de 1917, na Rússia, trouxe mais benefícios para a Europa Ocidental do que para a Europa Oriental."
"Depois da constituição do mundo socialista, o mundo capitalista, que foi fortalecido depois da Segunda Guerra, com medo do socialismo e também pela organização da sociedade, resolveu atender grande parte das aspirações da sociedade."
Por fim, relembrou a crise de 2009. "O Brasil hoje é reconhecido como o País que melhor soube lidar com a crise econômica". Segundo Lula, os ricos "não souberam nem tomar um chá de capim-santo."
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