Tribunal recua e libera candidatos 'contas sujas'
Político que teve conta de campanha reprovada pode disputar eleição
Em março, TSE havia decidido que candidato sem aprovação ficaria inelegível até que termine a legislatura DE BRASÍLIA O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) voltou atrás e decidiu, por 4 votos a 3, que candidatos que tiveram as contas eleitorais reprovadas, os chamados "contas-sujas", poderão participar das eleições municipais deste ano. Em março, a corte havia editado uma resolução, dizendo que tais candidatos seriam inelegíveis. Ontem, o tribunal finalizou a análise sobre um pedido de reconsideração feito pelo PT, acompanhado por 13 outros partidos, que havia sido interrompida na última terça-feira, por um pedido de vista do ministro José Antonio Dias Toffoli, quando o placar estava empatado em 3 a 3. A mudança de orientação aconteceu pois Toffoli entrou no lugar do colega Ricardo Lewandowski, que deixou a presidência do tribunal e sua cadeira no TSE em abril. Ele havia votado pela inelegibilidade dos candidatos com contas eleitorais reprovadas. O voto de Toffoli, porém, considerou que a legislação eleitoral apenas determina que o candidato tem que apresentar suas contas de campanha para ficar quite com a Justiça Eleitoral, não sendo necessário que elas sejam aprovadas. Após disputar uma eleição, todo candidato tem obrigação de apresentar uma prestação de contas dos recursos arrecadados e gastos na campanha. Essas contas podem ser aprovadas ou reprovadas pelos tribunais eleitorais. A resolução de março foi aprovada por 4 votos a 3. O pedido de reconsideração foi relatado pela ministra Nancy Andrighi, que havia votado a favor resolução anterior. Segundo seu voto proferido na última terça, os políticos que não têm as contas aprovadas devem sofrer a mesma punição dos que não apresentam as contas, ou seja, ficar inelegível até o fim da legislatura que disputou. "Todas as situações de irregularidades na prestação de contas terão a mesma consequência ao candidato [ficar inelegível]", disse Andrighi. Os ministros Marco Aurélio Mello e Cármen Lúcia, presidente do tribunal, votaram com a relatora. "Penso que amanhã a Justiça Eleitoral será excomungada pela opinião pública [se mudarmos a resolução]. O tribunal está considerando o certo por errado", disse o ministro Marco Aurélio, também na última sessão. |
sexta-feira, 29 de junho de 2012
Tribunal recua e libera 'contas sujas'
Folha de S. Paulo, 29 de junho de 2012.
quinta-feira, 28 de junho de 2012
Segurança Pública e o caso de Alagoas
Folha de S. Paulo, 28 de junho de 2012.
A implementação de uma política de segurança eficaz tem se tornado um dos maiores desafios do Estado brasileiro, especialmente devido à multicausalidade da violência.
É certo que a criminalidade decorre de fatores que variam territorial e temporalmente. Uma política que se pretenda vitoriosa tem de abarcar todas as nuances possíveis, atenta às singularidades locais.
Historicamente, a criminalidade e a violência têm ceifado vidas e retardado o desenvolvimento social e econômico do Estado de Alagoas e do Brasil. Desde 1999, o número de homicídios cresceu ininterruptamente naquele Estado, atingindo a taxa de 66,88 para cada 100.000 habitantes em 2010. Isso significa quase duas vezes e meia a taxa brasileira, que foi de 27,39 para o mesmo ano.
Diante desse quadro, desde janeiro de 2011 os governos federal e estadual intensificaram o diálogo com o objetivo de enfrentar o problema.
Os esforços culminaram nas medidas implementadas a partir de agora, com o lançamento ontem do programa Brasil Mais Seguro em Alagoas. Governos federal, estadual e municipal envidam esforços suprapartidários para enfrentar a violência e a criminalidade.
A finalidade é coibir a violência em geral. O foco, porém, está no seu delito mais grave, o homicídio. Nosso objetivo é claro: evitar esse crime.
Serão realizadas e intensificadas as ações preventivas, como o policiamento comunitário com o apoio da Força Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, a utilização de bases policiais comunitárias fixas e móveis e de sistemas de videomonitoramento.
Considerando que 84 de cada 100 homicídios cometidos em Alagoas (e 71 em cada 100 no Brasil) ocorrem com armas de fogo, também serão reforçadas as medidas para retirar de circulação e destruir o maior número possível de armamento.
Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal também atuarão, especialmente contra grupos de extermínio e organizações criminosas.
Juntamente com as forças de segurança pública, outros órgãos se engajam na luta contra a impunidade. No âmbito da perícia forense, novos equipamentos e capacitação dos peritos garantirão maior robustez às provas. Já nas polícias civil e militar, será criada uma delegacia especializada em homicídios e serão realizados cursos para aperfeiçoar a capacitação dos profissionais.
Somadas, essas medidas auxiliarão na identificação dos autores dos delitos. A integração e participação do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública promoverão o adequado andamento dos processos. Ratificando essas iniciativas, o Ministério da Justiça, o governo de Alagoas, o Tribunal de Justiça, o Ministério Público e a Defensoria Pública celebrarão acordo de cooperação para apoiar o programa de redução da criminalidade.
Todas essas ações pertencem ao campo da atuação direta da segurança pública. Existem outras, entretanto, indiretas, que são igualmente importantes para a redução da violência e da criminalidade. A diminuição da pobreza, o aumento dos postos de trabalho e o acesso à educação no país são parte de políticas públicas fundamentais nesse processo.
É, portanto, o momento de Alagoas se unir, dos três entes federados trabalharem unidos para fortalecer políticas contra a violência, a criminalidade e a impunidade. A sociedade é essencial nessa transformação de cenário e de cultura. Só com a participação de todos conseguiremos construir um Estado e um país mais seguros e de paz.
TEOTÔNIO VILELA FILHO, 61, é governador de Alagoas
JOSÉ EDUARDO CARDOZO, 53, é ministro da Justiça
Teotônio Vilela Filho e José Eduardo Cardozo
TENDÊNCIAS/DEBATES
Segurança pública e o caso de Alagoas
O número de homicídios cresce desde 1999, a taxa alagoana é bem maior do
que a brasileira. A Força Nacional de Segurança irá apoiar o
policiamento local
A segurança pública é um direito fundamental. Sem ela, o direito à vida
-o maior de todos- fica prejudicado, inviabilizando todos os demais
direitos fundamentais, como o direito à educação, à saúde e ao trabalho.
A implementação de uma política de segurança eficaz tem se tornado um dos maiores desafios do Estado brasileiro, especialmente devido à multicausalidade da violência.
É certo que a criminalidade decorre de fatores que variam territorial e temporalmente. Uma política que se pretenda vitoriosa tem de abarcar todas as nuances possíveis, atenta às singularidades locais.
Historicamente, a criminalidade e a violência têm ceifado vidas e retardado o desenvolvimento social e econômico do Estado de Alagoas e do Brasil. Desde 1999, o número de homicídios cresceu ininterruptamente naquele Estado, atingindo a taxa de 66,88 para cada 100.000 habitantes em 2010. Isso significa quase duas vezes e meia a taxa brasileira, que foi de 27,39 para o mesmo ano.
Diante desse quadro, desde janeiro de 2011 os governos federal e estadual intensificaram o diálogo com o objetivo de enfrentar o problema.
Os esforços culminaram nas medidas implementadas a partir de agora, com o lançamento ontem do programa Brasil Mais Seguro em Alagoas. Governos federal, estadual e municipal envidam esforços suprapartidários para enfrentar a violência e a criminalidade.
A finalidade é coibir a violência em geral. O foco, porém, está no seu delito mais grave, o homicídio. Nosso objetivo é claro: evitar esse crime.
Serão realizadas e intensificadas as ações preventivas, como o policiamento comunitário com o apoio da Força Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, a utilização de bases policiais comunitárias fixas e móveis e de sistemas de videomonitoramento.
Considerando que 84 de cada 100 homicídios cometidos em Alagoas (e 71 em cada 100 no Brasil) ocorrem com armas de fogo, também serão reforçadas as medidas para retirar de circulação e destruir o maior número possível de armamento.
Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal também atuarão, especialmente contra grupos de extermínio e organizações criminosas.
Juntamente com as forças de segurança pública, outros órgãos se engajam na luta contra a impunidade. No âmbito da perícia forense, novos equipamentos e capacitação dos peritos garantirão maior robustez às provas. Já nas polícias civil e militar, será criada uma delegacia especializada em homicídios e serão realizados cursos para aperfeiçoar a capacitação dos profissionais.
Somadas, essas medidas auxiliarão na identificação dos autores dos delitos. A integração e participação do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública promoverão o adequado andamento dos processos. Ratificando essas iniciativas, o Ministério da Justiça, o governo de Alagoas, o Tribunal de Justiça, o Ministério Público e a Defensoria Pública celebrarão acordo de cooperação para apoiar o programa de redução da criminalidade.
Todas essas ações pertencem ao campo da atuação direta da segurança pública. Existem outras, entretanto, indiretas, que são igualmente importantes para a redução da violência e da criminalidade. A diminuição da pobreza, o aumento dos postos de trabalho e o acesso à educação no país são parte de políticas públicas fundamentais nesse processo.
É, portanto, o momento de Alagoas se unir, dos três entes federados trabalharem unidos para fortalecer políticas contra a violência, a criminalidade e a impunidade. A sociedade é essencial nessa transformação de cenário e de cultura. Só com a participação de todos conseguiremos construir um Estado e um país mais seguros e de paz.
TEOTÔNIO VILELA FILHO, 61, é governador de Alagoas
JOSÉ EDUARDO CARDOZO, 53, é ministro da Justiça
terça-feira, 26 de junho de 2012
Paraguai: visões distintas
Folha
de S. Paulo, 26 de junho de 2012.
Vladimir Safatle
As leis
Egito e Paraguai não têm muita coisa em comum, a não ser a fragilidade de
suas democracias. Eis países que gostariam de se ver caminhando em direção à
consolidação democrática, mas que descobrem como tal caminho pode ser
atrapalhado, vejam só, pelas leis.Certamente, uma afirmação dessa natureza será rapidamente contraposta pelos ditos defensores do Estado democrático de Direito.
Na verdade, tais defensores querem nos fazer acreditar que as leis que temos devem sempre ser respeitadas, sob o risco de entrarmos em situações de puro arbítrio nas quais o mais forte impõe sua vontade. Eles esquecem como, muitas vezes, criamos leis que visam permitir que grupos interfiram e fragilizem os processos democráticos. Ou seja, leis que são, na verdade, a mera expressão da vontade dos grupos sociais mais fortes.
Isso explica porque a democracia, muitas vezes, avança por meio da quebra das leis. Ela reconhece que ações hoje vistas como criminosas possam ser, na verdade, portadoras de exigências mais amplas de justiça. Foi assim, por exemplo, com as greves -compreendidas durante muito tempo como crimes, e aceitas hoje como direito de todo trabalhador. Vale a pena lembrar desse ponto porque vimos no Egito e no Paraguai situações exemplares do uso da lei contra a democracia.
No Egito, um tribunal constitucional dissolveu o primeiro Parlamento democraticamente eleito da sua história por julgar inconstitucional uma lei parlamentar que proibia membros do regime ditatorial de Mubarak de participar de eleições. Não só a lei aprovada pelo Parlamento era justa, como o ato de dissolvê-lo por julgar inconstitucional uma de suas ações é claramente uma aberração. Mas tal golpe foi feito na mais clara "legalidade" e sem nenhuma manifestação da comunidade internacional.
Já no Paraguai, o Congresso votou o impeachment do presidente em um processo sumário, que durou algumas horas e sob a acusação nebulosa de incompetência (há de perguntar qual parlamentar escaparia de uma acusação dessa natureza). Tal lei serve apenas para tornar o presidente refém de um Congresso que, há mais de cem anos, representa as mesmas oligarquias. Um processo sério de impeachment exigiria amplos direitos de defesa e esclarecimento. Mas tudo foi feito "legalmente".
Diga-se, de passagem: até o golpe de Estado brasileiro (1964) foi feito "legalmente", já que o presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, declarou vacante a Presidência por Goulart ter "abandonado" o governo ao procurar abrigo no RS, tomando posse o presidente da Câmara, Ranieri Mazzilli. O que demonstra como nem sempre estamos protegidos pelas leis.
Folha
de S. Paulo-- editorial
Paraguai soberano
Apesar de cercear direito de defesa, impeachment do presidente foi
constitucional; é abuso dos países vizinhos pretender impor sanções A Corte Suprema de Justiça do Paraguai recusou ontem a alegação do ex-presidente Fernando Lugo de que foi inconstitucional o fulminante processo de impeachment pelo qual o Congresso o depôs, entre quinta e sexta-feira passada.
Com a decisão, caem por terra as pretensões de invalidar a posse do vice Federico Franco como sucessor constitucional. Também ontem a Justiça Eleitoral do país vizinho refutou a possibilidade de antecipar as eleições presidenciais, previstas para abril de 2013.
Não resta dúvida de que o impedimento de Lugo se deu sob evidente cerceamento do direito de defesa, cujo exercício ficou confinado a apenas duas horas de argumentação perante os parlamentares. Infelizmente, porém, a Constituição paraguaia não disciplina esse importante aspecto.
Exige apenas que o processo seja aprovado por dois terços da Câmara e que o afastamento ocorra se assim decidirem dois terços do Senado -limites amplamente superados nas votações que consumaram o impeachment.
Como motivo, basta a alegação genérica de "mau desempenho de suas funções".
Eleito numa plataforma esquerdizante, o ex-bispo católico Fernando Lugo conduzia um governo populista e errático, prejudicado pela conduta pessoal do mandatário, compelido a reconhecer filhos em escandalosos processos de paternidade.
Mas o motivo principal da derrocada foram os efeitos desastrosos da crise econômica no Paraguai, cujo produto nacional deverá encolher 1,5% neste ano. A popularidade presidencial se desfez depressa, tornando possível a formação da esmagadora maioria congressual que o afastou do cargo.
Por afinidade ideológica -maior no caso da Argentina, menor no de Brasil e Uruguai-, os demais governos do Mercosul decidiram suspender a presença do vizinho na reunião do organismo, que deve culminar na sexta-feira próxima, quando examinarão possíveis sanções contra o novo governo em Assunção.
Esse comportamento é injustificável. As cláusulas democráticas previstas pelo Mercosul e pela Organização dos Estados Americanos (OEA) aplicam-se a flagrantes violações da ordem constitucional. Ainda que o impedimento de Lugo seja criticável, as instituições paraguaias têm funcionado de acordo com as leis daquele país.
Com um triste histórico de ingerência na política interna do Paraguai, país que mantém laços de dependência econômica em relação ao Brasil, o melhor que o Itamaraty tem a fazer é calar-se e respeitar a soberania do vizinho.
sábado, 23 de junho de 2012
Pragmatismo político e democracia
O Estado de S. Paulo,
23 de junho de 2012.
Ganhos, perdas e danos do
pragmatismo político
Marco
Aurélio Nogueira - O Estado de S.Paulo
Houve uma
época em que os gestos políticos orientavam a opinião pública e os cidadãos.
Adversários eram adversários. Podiam conviver educadamente, mas se posicionavam
como entidades distintas, donos de posições singulares, que não permitiam
movimentos de convergência, a não ser quando estivessem em jogo o futuro da
Pátria ou os interesses nacionais. Acordos e alianças se faziam, mas ideias e
princípios não se negociavam.
Tudo isso
parece hoje pertencer a uma época pretérita que não volta mais. O mundo mudou,
a política virou de ponta-cabeça, deixou-se invadir de tal forma pelos negócios
e pelo pragmatismo que terminou por perder sua força magnética, de organização
de esperanças e utopias.
Houve
avanços nesse processo. Algumas ilusões tiveram de ser abandonadas e os
protagonistas da política foram convidados a ultrapassar a barreira da pureza,
da "ética da convicção" extremada, em benefício da realpolitik, da
conquista de eleitores e da conservação do poder - coisas que se diluíram numa
sempre mais proclamada "ética da responsabilidade".
O Partido
dos Trabalhadores (PT) foi, na época pretérita que não volta mais, o partido
que mais longe levou a ética extremada da convicção. Revestiu-a de ideologia,
de promessas reformadoras, de compromissos com a população pobre e abandonada.
Fez disso uma plataforma que o projetou para o primeiríssimo plano da política
nacional e o converteu no principal partido do País.
Vieram,
porém, os governos Lula (2002-2010) e tudo se transformou. O pragmatismo cortou
o partido de cima a baixo, ao mesmo tempo que o personalismo de Lula o cortou
da esquerda à direita. O foco passou a ser muito mais o Estado do que a
sociedade civil ou a opinião pública, e o partido se entregou ao controle de
posições políticas fortes, convencido de que assim a mudança social
aconteceria. Perdeu alguns anéis nessa operação, assistiu à debandada de parte
de seus setores mais à esquerda e aceitou o protagonismo inconteste de sua
liderança máxima, que se tornou o condutor único de todas as operações, da
nomeação de ministros à escolha de candidatos às eleições.
Entretanto,
houve uma pedra no caminho. Lula e o PT não conseguiram entrar em São Paulo,
que se manteve - Estado e capital - sob controle do PSDB. O desafio paulista
cresceu com a vitória de Dilma Rousseff. Afinal, como projetar a preponderância
petista em Brasília sem a conquista do principal Estado do País, epicentro da
vida econômica e social brasileira?
O
pragmatismo foi, então, radicalizado. Para as eleições municipais de 2012,
decidiu-se fixar uma candidatura que tivesse cheiro de tinta fresca, com a qual
se pudesse contestar o predomínio tucano. E optou-se, mais uma vez, por dar uma
guinada para o centro, de modo a neutralizar a força que o PSDB acumulou nesse
segmento crucial.
Ainda que
de modo meio torto, o PT que se subsumiu a Lula passou a mostrar maturidade,
arquivou seus arroubos ideológicos, trocou a pureza pela
"responsabilidade". Converteu-se em ator principal e fez com que
todos passassem a considerá-lo com seriedade.
O
problema é que o ingresso do PT na arena da grande política está se fazendo
pela porta da pequena política, onde são feitos pactos com o diabo, ou com
jurados inimigos de ontem, pragmaticamente.
Política
sem acordos e coligações, sem barganhas e concessões, é como noite sem lua. Não
avança nem produz resultados positivos. Mas há modos e modos de se fazer isso.
Ao
aceitar os afagos de Paulo Maluf, na cerimônia em que o deputado aderiu à
campanha de Fernando Haddad, o PT de Lula reiterou sua conversão ao jogo frio
da política. Trocou a paixão pelo cálculo, pela contagem de apoios, minutos de
propaganda e votos potenciais. Foi, porém, com sede total ao pote. Permitiu que
o líder do PP explorasse ao máximo a aproximação. O gesto simbólico nos jardins
de sua mansão foi a cereja no bolo.
Houve
ganhos para ambos os lados. O PT incorporou 1'30'' à sua propaganda e passou a
dispor, em tese, de acesso mais privilegiado aos redutos eleitorais malufistas,
ainda que sem garantias. De quebra, desafinou o coro dos contentes, mostrando
que agora são outros tempos, outras amizades, que não somente os tucanos podem
comer na seara do centro e da direita.
Maluf,
por sua vez, recebeu oxigênio adicional para seguir fazendo política, quem sabe
agora com o benefício de não ser mais visto como o bicho-papão do autoritarismo
e da corrupção. Também não teve garantia de nada, mas soube como extrair
dividendos evidentes da operação. Ganhou uma exposição que, em outros tempos,
seria inimaginável. Emplacou, ainda por cima, um aliado na Secretaria Nacional
de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades.
As perdas
e os danos do acordo, porém, parecem a essa altura maiores do que os ganhos. O
PT perdeu Luiza Erundina, ainda que ela, ao desistir da candidatura a vice, mas
não da campanha, tenha oferecido ao partido uma aura de "dignidade
política" que ajuda a contrabalançar as coisas. Perdeu também excelente
oportunidade para traduzir em fatos o proclamado desejo de fazer uma campanha
com o selo da renovação. Como convencer o eleitor de que algo "novo"
desponta, quando o "velho" aparece com ele abraçado quase ao ponto de
sufocar?
A
democracia também perdeu, pois o pragmatismo político usurpou o lugar que nela
devem ter o realismo, a coerência, os valores e os ideais, aumentando ainda
mais o fosso que distancia as pessoas da política institucionalizada.
Consolidou-se um modo de fazer campanha eleitoral. Nele, os políticos se
abraçam, fazem festa, tramam e decidem. Num segundo momento, os eleitores
votam. Ou nem isso.
O que
resultará disso, no curto, no médio e no longo prazos, é questão inteiramente
em aberto.
Sarney ficou 'surpreso'
Folha de S. Paulo, 23
de junho de 2012.
Sarney
diz que ficou 'surpreso' com espionagem
DE BRASÍLIA
Ex-presidente
da República, o senador José Sarney (PMDB-AP) disse ontem que ficou
"surpreso" ao saber que a presidente Dilma Rousseff foi monitorada
pelo SNI (Serviço Nacional de Informação) durante o seu governo, como revelou a
Folha nesta semana.
Sarney
negou ter autorizado a espionagem em sua gestão (1985-90) contra a hoje
presidente, apontada na fase pós-ditadura pelo SNI como parte de um
"infiltração comunista" no Rio Grande do Sul.
"Eu
tive a mesma surpresa que todo mundo teve ao ler essa notícia. Eu tinha
determinado que jamais o SNI fizesse investigação sobre qualquer pessoa",
afirmou.
O
monitoramento consta de documentos abertos ao público recentemente que integram
o chamado "Acervo da Ditadura", do Arquivo Nacional.
quinta-feira, 21 de junho de 2012
Dilma foi monitorada pelo SNI
Folha
de S. Paulo, 21 de junho de 2012.
Dilma foi
monitorada pelo SNI durante governo Sarney
Papéis
inéditos do Arquivo Nacional apontam a existência de 17 relatórios
Arapongas
diziam que Dilma fazia parte de infiltração comunista; Sarney afirma que não
ordenou espionagem
RUBENS
VALENTE
DE BRASÍLIA
DE BRASÍLIA
Documentos
abertos agora ao público mostram que a presidente Dilma Rousseff foi monitorada
não apenas durante a ditadura militar (1964-85), quando foi presa e torturada,
mas em todo o governo de José Sarney (1985-90), hoje presidente do Senado.
Os papéis
integram o chamado "Acervo da Ditadura", do Arquivo Nacional, um
conjunto de mais de oito milhões de páginas produzidas pelos órgãos de
inteligência da ditadura e do governo Sarney sobre a vida de aproximadamente
308 mil pessoas, sindicatos e partidos.
Em
pesquisa na base de dados do acervo, a Folha identificou um total de 181
documentos com referências a Dilma, que começam em 1968, quando ainda era
estudante universitária, e se estendem ao final dos anos 80.
Dezessete
dos papéis foram produzidos durante o governo Sarney pelo SNI (Serviço Nacional
de Informações).
Na fase
pós-ditadura, o SNI apontava Dilma como parte de uma "infiltração
comunista" em órgãos da prefeitura e do governo do Rio Grande do Sul,
chamando a atenção para a sua passagem pelos grupos da esquerda armada
VAR-Palmares e Colina.
Os
relatórios registram a atuação de Dilma no movimento feminista que, segundo o
SNI, buscava "a conscientização das massas, pretendida por facções
esquerdistas que almejam o poder".
O SNI
também monitorou uma viagem de Dilma ao México e acompanhou comício que Dilma e
Lula participaram contra a ampliação do mandato presidencial de Sarney, em
1988.
Ao
integrar o secretariado de Alceu Collares (PDT) na Prefeitura de Porto Alegre,
em 86, Dilma foi alvo de outro relatório. O SNI disse que a prefeitura tinha
"infiltração" de pessoas "com registros de atividades
subversivas".
Relatórios
do SNI da década de 70 sobre Dilma dizem respeito a uma suposta ligação com a
JCR (Junta de Coordenação Revolucionária), grupo de esquerda armada. Dois
relatórios dizem que ela se reuniu com membros da JCR. Um terceiro relatório de
79, porém, agora revelado, diz não ter encontrado comprovação dessa alegação.
Em 2011,
Dilma negou ter mantido reuniões com membros da JCR ou mesmo conhecer a
organização. Procurado ontem, o Planalto disse que não vai se manifestar.
A
assessoria de Sarney disse que, em seu mandato na Presidência, ele havia
ordenado ao SNI que não realizasse "levantamentos sobre a vida
privada" de "nenhum brasileiro". Disse ainda que não era
informado sobre objetivos e resultados do SNI.
O acervo
agora tornado público integra os chamados "dossiês pessoais" e só
podia ser consultado por terceiros após autorização da pessoa.
Com a Lei
de Acesso à Informação, o Arquivo deu prazo para as pessoas pedirem bloqueio
aos seus dossiês. Ninguém, incluindo Dilma, se manifestou, o que tornou a
liberação automática.
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